I Congresso de Pastorais da Mobilidade Humana

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Documento Final do I Congresso de Pastorais da Mobilidade Humana

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Convocado pelo Departamento de Justiça e Solidariedade do Conselho Episcopal Latino-americano (CELAM), realizou-se, de 12 a 16 de maio de 2014, na Casa Monte Alverne, na cidade de Panamá, o I Congresso de Pastorais de Mobilidade Humana, com a participação de 130 pessoas: bispos, sacerdotes diocesanos e religiosos, religiosas e leigos, representantes de organizações pastorais de diferentes países.

O Congresso foi organizado pela Pastoral de Mobilidade Humana do CELAM, Irmãs Missionárias de São Carlos (Scalabrinianas), Rede Jesuíta com Migrantes da América Latina e do Caribe (RJM-LAC), Scalabrini International Migration Network (SIMN) e Secretariado Latinoamericano de Pastoral Social/Caritas e a Conferencia Episcopal do Panamá; contou com representantes das quatro áreas pastorais: Migrantes e Refugiados; Apostolado do Mar; Pastoral do Turismo; Pastoral dos Itinerantes, e das organizações que animam as pastorais nos diversos países da América Latina e Caribe.

Agradecemos e valorizamos a participação no Congresso de representantes do Pontifício Conselho para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes, da Comissão Católica Internacional de Migrações (CCIM), da Direção Geral das Irmãs, Padres e Missionárias Seculares Scalabrinianas, além do delegado do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

A partir do Evangelho e da Doutrina social da Igreja, o objetivo do Congresso foi fortalecer e avançar no reconhecimento, defesa e promoção da vida, dos direitos e da dignidade das pessoas em situação de mobilidade e, a partir de seus clamores e sofrimentos, da memória histórica, do intercâmbio de experiências, da avaliação das estruturas, dos novos cenários de mobilidade humana, seguirmos assumindo e implementando, de maneira sinérgica, linhas de ação nas diferentes áreas pastorais da Mobilidade Humana.

Na mensagem de abertura, D. Pedro Barreto Jimeno, presidente do Departamento de Justiça e Solidariedade do CELAM, desejou “que a reflexão partilhada através do diálogo e intercâmbio da prática pastoral renove nosso compromisso com força pascal, de modo que a Igreja viva sua missão nas periferias vulneráveis da sociedade, como é a realidade dos migrantes, itinerantes, gente do mar e do turismo, refugiados e deslocados. Assim, colocamos em prática o desejo do Papa Francisco de ser uma Igreja pobre e para os pobres”. Por outra parte, a mensagem do Cardeal Antonio Maria Vegliò nos recordou e nos animou com os princípios da Doutrina Social da Igreja, como base de nossa espiritualidade e de nosso atuar no vasto campo da Mobilidade Humana.

Neste sentido, o Congresso nos convocou a um olhar amplo sobre o fenômeno da mobilidade humana em todo o mundo e mais particularmente na América Latina e no Caribe. Esta, no contexto atual da economia globalizada, adquiriu uma dimensão estrutural sem precedentes, seja quanto ao número de pessoas que se move, como também quanto aos deslocamentos de massa, cada vez mais intensos, complexos e diversificados. Enquanto, por um lado, abrem-se cada vez mais as fronteiras para o capital, as mercadorias, a tecnologia e os serviços, por outro lado, as pessoas participantes nestes movimentos de migração, itinerância, refúgio e deslocamento em terra e mar, sofrem múltiplas restrições e violações dos direitos humanos.

Estas violações se mostram muito concretas em algumas realidades do Continente, especialmente na fronteira do México com Estados Unidos, na República Dominicana, na América Central e outros países e regiões. É uma verdadeira Vía crucis, onde muitas pessoas em mobilidade e agentes de pastoral foram testemunhas e vítimas de agressões, separação dos grupos familiares, atropelos, perseguições e torturas, pagando muitas vezes com ameaças à família, com o sangue e a própria vida.

Em termos nacionais e internacionais, o pano de fundo das políticas migratórias continua sendo a ideologia da segurança nacional e de um modelo econômico excludente. Apesar destas adversidades, a busca de trabalho e de melhores condições de vida, entre outras razões, continua movimentando milhões de pessoas em todas as direções. É difícil encontrar hoje em dia um país que não esteja enfrentando este fenômeno como lugar de origem, trânsito, destino e/ou retorno, como também o desafio da inserção social, política, cultural e econômica das pessoas envolvidas.

Os debates sublinharam os desafios e a solicitude pastoral com migrantes, refugiados, deslocados, gente do mar, povo itinerante e do mundo do turismo, em diferentes situações socioeconômicas e político-culturais. Nesta realidade, mais que sublinhar a segurança nacional e a ordem econômica, há que ter em conta os direitos e a dignidade humana de quem está em situação de mobilidade. Além disto, no lugar de ver as pessoas como um problema, há que vê-las, a partir do ponto de vista evangélico, como uma oportunidade de intercâmbio de povos, culturas e valores. De acordo com o Documento de Aparecida os que se movem pelos caminhos do êxodo são, mais que tudo, protagonistas da evangelização (DAp,11).

Esta oportunidade, se levada a sério, constitui um duplo desafio: a conversão pessoal e o enriquecimento social daqueles que partem e daqueles que acolhem. De fato, a pessoa, ao deslocar-se por razões laborais, de itinerancia, de descanso, de violência ou de perseguição, põe a caminho a sociedade, a Igreja e a própria história, pois a mobilidade humana é sempre e ao mesmo tempo causa e efeito de profundas mudanças estruturais.

Em grandes linhas, este deslocamento de pessoas representa o parto de uma nova forma de vida, e não há que esquecer que todo o nascimento carrega, ao mesmo tempo, dor e esperança. Segundo a Doutrina Social da Igreja, no coração de cada pessoa e no coração de cada cultura há sementes do Verbo. Assim que, quando se põem a caminho, as pessoas levam também seus mais ricos valores, tradições e costumes. Disto resulta que, no âmbito da fé, aquele que se transfere de seu lugar de origem para outro é um profeta que abre novos horizontes à história.

Nossas grandes preocupações, entre outras, são as violações aos direitos humanos neste campo da mobilidade, o tráfico de pessoas e contrabando de migrantes, o tema das políticas públicas, a exploração dos vários grupos ali envolvidos, tais como, marinheiros, servidores turísticos, itinerantes, migrantes, refugiados e trabalhadores em geral, o que nos recorda “os comerciantes de carne humana”, como dizia Scalabrini.

Outras preocupações são, igualmente, a necessidade de formação e capacitação de agentes de pastoral, a sensibilização da sociedade civil, dos governos, organismos internacionais e da própria Igreja.
Há que ter presente também que, enquanto a Pastoral da Mobilidade Humana representa um suporte às pessoas em movimento, elas próprias devem ser as protagonistas de sua integração em uma nova sociedade e do resgate de sua dignidade. Por outro lado, palavras como acolhida, escuta, hospitalidade e inculturação não podem ser ignoradas na pastoral junto a quem está longe da família, de sua terra ou de sua pátria.

Frente a esta realidade, as quatro áreas da ação Pastoral da Mobilidade Humana – Migrações, Turismo, Itinerantes e Apostolado do Mar – reafirmam seu compromisso de trabalhar em rede harmônica e sinérgica, contribuindo para o avanço na organização e ação sócio pastoral em âmbito continental.

No marco deste Congresso, além de um panorama da realidade e de testemunhos e práticas pastorais, a reflexão bíblico-teológica iluminou o horizonte de nosso trabalho. Em base a tudo isto, as diversas pastorais reafirmam os seguintes compromissos:

a) Pastoral dos migrantes e refugiados

  1. Promover o fortalecimento da Pastoral de Mobilidade Humana, articulada com as redes de proteção, prevenção, observação e incidência a favor de migrantes, refugiados e deslocados.
  2. Promover o protagonismo do migrante, refugiado e deslocado, em coordenação com instituições afins, nos países de origem, trânsito e destinos, gerando processos de desenvolvimento comunitário, integral e sustentável.
  3. Incidir nos processos de construção de leis e políticas públicas a favor dos migrantes, deslocados e refugiados, com propostas de integração e de alternativas às detenções e deportações.
  4. Dinamizar e fortalecer os espaços de encontros e diálogos entre os bispos, as conferências episcopais e entre os diversos agentes e atores que interveem na pastoral de migrantes, refugiados e deslocados.

b) Apostolado do Mar:

  1. Promover a formação de agentes, para que tenham uma profunda espiritualidade, sensibilidade e paixão em seu atuar.
  2. Abrir espaços de participação para leigos comprometidos que se envolvam neste apostolado e tornem visível o rosto misericordioso do amor de Deus por todas as pessoas.
  3. Aproveitar os meios de comunicação, para trabalhar em “rede”, que permita crescer em experiências e apoio entre as diferentes realidades em que ocorre o Apostolado do Mar.
  4. Dar continuidade aos processos pastorais que se empreendam no Apostolado do Mar que envolve aos agentes diocesanos e religiosos destinados ao trabalho específico desta Pastoral.
  5. Integrar o Apostolado do Mar nos planos pastorais nacionais, diocesanos e paroquiais.

c) Pastoral do Turismo: Evangelizar o mundo do turismo, para colaborar na construção do diálogo cultural e religioso, no respeito às comunidades locais e ao entorno ecológico, na denuncia da exploração sexual e na defesa e promoção dos direitos dos atores do turismo:

  1. Promover e facilitar a animação da Pastoral do Turismo, mediante a formação e capacitação de agentes de pastoral, promovendo sua identidade como missionários de Jesus Cristo.
  2. Incidir como Pastoral do Turismo com maior presença e participação em âmbito eclesial e na sociedade para cuidar e resguardar a criação e promover a defesa do meio ambiente.
  3. Dedicar especial atenção às vítimas do mundo do turismo, entre elas, as crianças e adolescentes submetidos à exploração e prostituição, tipificada – segundo o Protocolo de Palermo – como crime de Tráfico de Pessoas, a partir de um trabalho em rede em âmbito de América Latina e Caribe.
  4. Resgatar, preservar e promover, a partir da Pastoral do Turismo, a identidade cultural das comunidades locais e suas possibilidades de desenvolvimento integral, mitigando os aspectos negativos do turismo nos ecossistemas e na cultural local, fortalecendo esta atividade como meio de prevenir migrações forçadas.
  5. Gerar ferramentas a nível continental para a sistematização e comunicação permanente das ações e processos da Pastoral do Turismo.

d) Pastoral dos Itinerantes:

  1. Trabalhar para dar visibilidade à Pastoral dos Itinerantes nos níveis eclesial e governamental;
  2. Difundir a realidade dos itinerantes em todos os níveis: político, social e de direitos humanos.
  3. Criar linhas de ação pastoral a médio e longo prazo;
  4. Promover nas diferentes conferências episcopais a Pastoral dos Itinerantes.
  5. Coordenar com as demais áreas da pastoral de mobilidade em cada país, com a finalidade de alcançar a articulação nacional e latino-americana.
  6. Buscar recursos através de projetos em comunhão com os outros setores da Pastoral da Mobilidade e nos diferentes países.

Os participantes do Congresso agradecem ao Papa Francisco suas frequentes referências ao fenômeno da mobilidade humana e nossa missão “Fiel ao modelo do Mestre, é vital que hoje a Igreja saia a anunciar o Evangelho a todos, em todos os lugares, em todas as ocasiões, sem demoras, sem repugnâncias e sem medo. A alegria do Evangelho é para todo o povo, sem excluir a ninguém.” (EG, n. 23).

Agradecem igualmente ao Cardeal Antonio Maria Vegliò, presidente do Pontifício Conselho para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes, por seu interesse e sua mensagem a este evento. Ao mesmo tempo, reafirmamos, com expressão de pedido, a importância de uma instância no CELAM para a articulação e dinamização da Pastoral da Mobilidade Humana, dada a intensidade e a complexidade desta realidade na América Latina e no Caribe. Neste campo, espera-se também que o CELAM promova oportunidades de diálogo e interação entre as Conferencias Episcopais do Norte e do Sul do Continente.

Ante os “rostos sofredores de Jesus Cristo” (Cfr. Doc. Puebla, 31-39) que desfilam pelos caminhos do mundo e que desfilaram em nossas seções do Congresso, os participantes das Pastorais de Mobilidade Humana se sentiram interpeladas a uma ação profética sempre mais efetiva na promoção de mudanças estruturais para o bem das pessoas em mobilidade. E como no episódio dos discípulos de Emaús (Lc 24, 13-35), os agentes presentes retornam às suas atividades cotidianas com um “novo ardor missionário”.

Pedimos à Virgem de Guadalupe, padroeira da América Latina e do Caribe, que nos acompanhe em nosso caminhar e que abençoe a Igreja, os participantes do Congresso, a todas as pessoas que atuam no campo da mobilidade humana e, de modo particular, os itinerantes, migrantes, refugiados, deslocados e gente do turismo e do mar.

Cidade do Panamá, 16 de maio 2014.

 

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