“Oito jeitos de mudar o mundo” com os Migrantes e Refugiados

Em todo o país, começa uma busca de somar esforços em torno da Semana Nacional pela Cidadania e Solidariedade, marcada para 9 e 15 de Agosto. Essa semana, organizada pelo Movimento Nacional Cidadania e Solidariedade[1], com parcerias tanto com o Governo quanto com Organismos Internacionais, terá uma mobilização pela visibilidade e aprimoramento das inúmeras ações sociais que ocorrem pelo País afora, a fim de que se reúnam em torno do que as Nações Unidas chamaram de objetivos do milênio.

 

João Paulo Santos

Rosita Milesi, mscs

Em todo o país, começa uma busca de somar esforços em torno da Semana Nacional pela Cidadania e Solidariedade, marcada para 9 e 15 de Agosto. Essa semana, organizada pelo Movimento Nacional Cidadania e Solidariedade[2], com parcerias tanto com o Governo quanto com Organismos Internacionais, terá uma mobilização pela visibilidade e aprimoramento das inúmeras ações sociais que ocorrem pelo País afora, a fim de que se reúnam em torno do que as Nações Unidas chamaram de objetivos do milênio.

A idéia é que, em uma agenda macro se reúnam todas as bandeiras, lutas, organizações e pessoas que acreditam que o mundo pode ser diferente. Nessas possibilidades, começamos a pensar em dezenas de entidades que trabalham com migrantes e refugiados no universo brasileiro e como podemos incluir essa especificidade da luta dos direitos humanos, em especial a atuação de nosso Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH), nos macro-objetivos do milênio.

Nossa luta por uma mobilidade humana que não seja restrita ou marcada pela segurança estatal e pelo simples controle dos fluxos migratórios é, na verdade, um pilar dos direitos humanos, reconhecendo a luta de famílias e comunidades que migram em busca vida digna. Dentro dos oito objetivos do milênio, ou como disse Frei Betto em recente artigo inspirador, entre “Oito jeitos de mudar o mundo”, acreditamos que, no mundo dos migrantes e dos refugiados, podemos viver e dinamizar todos eles.

As metas do milênio

As oito metas do milênio podem ser resumidas na atenção ao fim da miséria, à educação básica e à proteção às crianças, às questões de gênero, de saúde pública e à busca de um desenvolvimento sustentável[3].

 

As primeiras causas da migração no mundo são focalizadas na exata expressão da primeira meta do milênio: erradicar a pobreza extrema e a fome. Pessoas de todo o mundo, por exemplo, atravessam a perigosíssima fronteira México/Estados Unidos, arriscando a própria vida em busca de mais dignidade e, às vezes, em busca da segurança de três refeições diárias. O mesmo ocorre na Europa, na Ásia, na África e, também, no Brasil, onde migrantes bolivianos, paraguaios e muitos outros buscam aqui alguma possibilidade de escapar das piores misérias.

Para erradicarmos a pobreza e a fome devemos ter em consideração cada ser humano que faz parte dessas multidões. Sem proteção estatal, sem programas de apoio, sem acesso ao mercado de trabalho, sem integração com a língua e a cultura local, terminam as possibilidades desses migrantes que sucumbem à miséria. A insistência governamental em cercear a entrada de migrantes em seus países e de se omitir na busca de políticas específicas para estes não fará nem aumentar a segurança do Estado e nem parar o movimento migratório. O único resultado possível será a permanência desses migrantes reduzidos à fome ou a pobreza extrema.

A situação específica das crianças e das mulheres

A atenção especial às mulheres e às crianças, expressa nas metas do milênio, é inevitável no mundo da mobilidade humana. A não-integração dos migrantes e refugiados tem sempre duas vítimas preferenciais: as crianças e as mulheres.

As crianças são as primeiras, com problemas de saúde e defasagem educacional extrema, na medida em que, por não terem os seus pais documentos que comprovem sua estadia regular nos países, não tem acesso a políticas públicas nessas áreas. A meta do milênio é que, em 2005, 95% das crianças estejam freqüentando as salas de aula: o primeiro passo é saber por que elas não estão lá. São muitos os motivos, pedagógicos, sócio-econômicos, etc. Contudo, os filhos de migrantes não regularizados que não vão às escolas o fazem por não terem a estas acesso ou pela defasagem curricular e de cronograma e, às vezes, por questão de segurança da própria família. Ir à escola pública não é incentivado ao migrante, pelo contrário, em muitos países, pode ser um meio de investigar a situação deste e acelerar sua punição.

Num mundo quase todo machista e patriarcal, nas trajetórias humanas, a mulher sempre sofre mais. Todas as trajetórias de emancipação familiar, busca pelo mercado de trabalho e capacitação profissional se tornam mais difíceis. O próprio texto dos objetivos do milênio traz o dado alarmante, “80% dos refugiados são mulheres e crianças”. A violência doméstica aumenta na medida da frustração masculina, que cresce quando a busca pelos sonhos de uma vida digna vão se acabando. E as mulheres vitimizadas, em situação irregular, temem ainda mais a busca de delegacias ou outra instância que seja para relatar seus sofrimentos.

Nas fronteiras e ao longo da trajetória da mulher migrante e refugiada, ela será sempre uma vítima em potencial, inclusive com abusos sexuais para favorecer acessos que, pela própria dignidade humana, ela teria direito.

Nossas Ações

São várias as ações que o IMDH realiza neste sentido e que deseja aprofundar e socializar.

a) A luta por uma nova lei de estrangeiros, que garanta acesso à saúde e à educação a todos os migrantes, independentemente de sua situação de regularidade legal ou não.  Atualizar nossa lei no que se refere ao acesso do migrante ao mercado de trabalho e proteção aos seus direitos trabalhistas e previdenciários também é algo urgente no combate a miséria.

 

b) O avanço para conquistar a vigência do Acordo de Livre Residência para os Nacionais dos Países do Mercosul, bem como o que inclui Bolívia e Chile. O Congresso Nacional aprovou recentemente o primeiro deles, o que já é um grande passo. Lutar, pois, pela aprovação do que ainda está tramitando no Congresso Nacional, bem como articular ações com organizações da sociedade civil dos outros Países do Mercosul, Bolívia e Chile, para que os Estados-Parte de cada Acordo o ratifiquem, possibilitando, assim, a entrada em vigor destes e de outros relativos a matérias que dizem respeito aos direitos e à proteção das pessoas em mobilidade.

c) A proteção e integração dos refugiados é igualmente um de nossos eixos de atuação. A lei nacional – Lei 9.474/97 – é instrumento modelo para o mundo.  Reconhecemos os avanços havidos também em sua implementação, mas emergem outros passos importantes: o estabelecimento de políticas públicas que sustentem os marcos legais e a assistência jurídica, bem como a sensibilização da sociedade, através de campanhas em favor da causa do refugiado e para tornar conhecidos estes direitos por parte da população brasileira.

d) Além do esforço por uma legislação e assistência que melhore para o migrante e o refugiado o acesso à justiça, o IMDH, vem estabelecendo, neste ano de 2004, novas frentes em que acredita: em projeto que conta com o apoio da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, e em parceria com a Caritas Arquidiocesana de São Paulo, o IMDH vem apostando em ações para a assistência e integração de refugiados. Neste sentido, busca sensibilizar outras instituições e, sobretudo, propôs-se a articulação e consolidação, até fins de 2004, de uma rede nacional – Rede Pastoral para Refugiados – para somar-se a outras ações já existentes e favorecer a ampliação e presença da sociedade civil, no conjunto tripartite – Governo, ACNUR e sociedade civil – responsável pela proteção, assistência e integração dos refugiados.

e) Um novo projeto, chamado “Construindo a Cidadania junto à criança e a mulher migrante” abriu espaço para o nosso trabalho no cumprimento integral das metas do milênio junto à populações na periferia de Brasília e, como um símbolo do mundo globalmente humano que queremos, auxiliamos mulheres e crianças migrantes em situação de risco, como gestantes adolescentes portadoras de HIV, ou crianças que recebem reforço escolar com lições iniciais sobre cidadania ou ecologia.

O Instituto Migrações e Direitos Humanos reforça o grito pela sensibilização em torno dos princípios básicos de cidadania para cada migrante e refugiado que, com os mesmos sonhos nossos de pão e liberdade, buscam abrigo em outros países. Ajudá-los, é cumprir as metas do milênio de um mundo mais justo e humano. No cotidiano, tentamos trabalhar promovendo e cobrando políticas públicas mais humanas e abertas e ainda, na acolhida a cada um deles e delas, sabendo da necessária especial atenção às mulheres e às crianças.

Na certeza do protagonismo dos migrantes e refugiados nessa mudança em torno da qual o mundo e o País se mobilizam, esperamos que a Semana pela Cidadania e Solidariedadeseja um momento para discutirmos isto tudo e principalmente, para sensibilizar e somar voluntários para crescer nossas iniciativas, em todos os lugares e também no mundo específico e imprescindível de ação da cidadania que é o universo da mobilidade humana.



[3] Literalmente, as metas do milênio são: 1)Erradicar a extrema pobreza e a fome; 2) Atingir o ensino básico universal; 3) Promover a igualdade entre os sexos; 4) Reduzir a mortalidade infantil; 5) Melhorar a saúde materna;6) Combater o HIV/AIDS, a Malária e outras doenças; 7) Garantir a sustentabilidade ambiental; 8) Estabelecer uma parceria mundial pelo desenvolvimento..