Irmã Rosita Milesi, diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH), participou da mesa de debates e fez alerta sobre o avanço do racismo religioso, da xenofobia e da desumanização das diferenças no Brasil.
Em um mundo cada vez mais marcado pela polarização e pela intolerância, representantes de diferentes tradições religiosas e culturais se reuniram no Centro Cultural de Brasília, na noite desta terça-feira (27), para participar do 2º Painel de Cultura de Convivência. O evento, promovido pelo Instituto pelo Diálogo Intercultural e pelo Centro Islâmico e de Diálogo Interreligioso, contou com apoio do Grupo de Cooperação Internacional de Universidades Brasileiras (GCUB) e do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC).
O evento foi estruturado em dois momentos de debate. A primeira mesa, intitulada “Academia: desafios contemporâneos para a cultura de convivência”, teve a mediação do Professor José Romero, da Universidade Católica de Brasília (UCB), e contou com as participação da Professora Carmen Lícia Palazzo. Os painelistas trouxeram reflexões sobre os impactos da crescente polarização, dos discursos de ódio e dos desafios que instituições e a sociedade enfrentam na promoção de uma cultura de paz, diálogo e respeito às diversidades.
Na segunda mesa, dedicada à “Sociedade Civil e Representantes Religiosos: experiências e práticas para a convivência”, o debate foi conduzido pela Pastora Romi Bencke, secretária-geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC). Este painel foi marcado por relatos de experiências concretas, desafios cotidianos e práticas que fortalecem o diálogo inter-religioso e a convivência solidária. Participaram da discussão a Ir. Rosita Milesi, diretora do Instituto de Migrações e Direitos Humanos (IMDH); Cristine Bastos, representante das religiões de matriz africana; e o Padre Marcos Barbosa, assessor da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Transformação social através do diálogo
Em sua fala, Ir. Rosita trouxe uma reflexão sobre os desafios da convivência em uma sociedade cada vez mais fragmentada. “Este painel representa não apenas um momento de reflexão, mas um compromisso coletivo com a transformação social através do diálogo intercultural e inter-religioso”, afirmou logo no início de sua fala.
Ela alertou para o avanço da intolerância e da desumanização das diferenças, especialmente no que diz respeito à população migrante, refugiada e às religiões de matriz africana. “Vemos o extremismo ideológico erguer muros invisíveis onde antes existiam espaços de diálogo. As diferenças que deveriam nos enriquecer foram sendo transformadas em abismos que separam pessoas que compartilham a mesma humanidade”, pontuou.
Ir. Rosita destacou que a hostilidade enfrentada por migrantes, refugiados e praticantes de religiões afro-brasileiras não pode ser dissociada do racismo estrutural presente na sociedade brasileira. “O racismo religioso não é apenas uma questão de intolerância espiritual. É a manifestação cruel de um projeto estrutural que nega o valor das expressões culturais e espirituais de povos afrodescendentes e das culturas que chegam com os novos fluxos migratórios”, alertou, mencionando dados que apontam um aumento de 270% nas denúncias de intolerância contra religiões de matriz africana em 2021.
Comprometimento com ações concretas
A religiosa também fez um apelo enfático para que a sociedade não se limite ao discurso, mas se comprometa com ações concretas. Ela elencou sete direções fundamentais para fortalecer uma cultura de convivência, que incluem: superar o mero reconhecimento jurídico, promover a articulação institucional, investir em educação transformadora e criar espaços seguros de encontro intercultural e inter-religioso.
Durante sua fala, Ir. Rosita também denunciou os efeitos das recentes políticas migratórias restritivas, que, segundo ela, colocaram em risco não apenas os serviços essenciais para migrantes e refugiados, mas também a própria missão de organizações humanitárias. “Este cenário penaliza duplamente: fragiliza quem acolhe e desampara quem precisa ser acolhido. Por isso, é fundamental que as comunidades religiosas, em diálogo conjunto, se mobilizem para exigir políticas públicas que garantam a continuidade dos serviços humanitários”, concluiu.
Ao final, os participantes destacaram a importância de transformar o diálogo em práticas cotidianas e políticas públicas que fortaleçam os laços sociais e combatam todas as formas de discriminação.