Tráfico de Pessoas: alguns registro e dados estatísticos

Não é raro encontrar relatórios sobre o tráfico de pessoas, mas, raro é, sim, encontrar dados estatísticos, números que revelem o tamanho e a abrangência deste crime. Sem maiores análises, apresento aqui alguns quadros ou breves relatos que podem ser ilustrativos desta realidade ainda tão encoberta e invisível quanto violadora de direitos.

 

Ir. Rosita Milesi, mscs

Não é raro encontrar relatórios sobre o tráfico de pessoas, mas, raro é, sim, encontrar dados estatísticos, números que revelem o tamanho e a abrangência deste crime. Sem maiores análises, apresento aqui alguns quadros ou breves relatos que podem ser ilustrativos desta realidade ainda tão encoberta e invisível quanto violadora de direitos.

1 – Segundo o Relatório Global sobre Tráfico de Pessoas, divulgado pelo UNODC, em fevereiro de 2009, mais de 2,4 milhões de pessoas são atualmente vítimas de tráfico para fins comerciais;

2 – A exploração sexual é a finalidade de maior incidência no tráfico de pessoas, com 79% dos casos; e a exploração laboral registra 18% das situações identificadas de tráfico de pessoas.

3 – Vítimas oficialmente identificadas por autoridades governamentais em 71 países, nos quais as estatísticas foram disponibilizadas:

Ano

N° de vítimas

2003

11.706

2004

12.122

2005

13.127

2006

14.909

Total

51.864

                               Fonte: Global Report on Trafficking in Persons (UNODC, 2009)

 

4 – Perfil das vítimas, na soma dos casos em 61 países, em 2006:

 

Vítimas

% sobre o total de casos identificados pelas autoridades de 61 países

Mulheres

66%

Meninas

13%

Homens

12%

Meninos

9%

                                Fonte: Global Report on Trafficking in Persons, UNODC, 2009

 

5 – Vítimas de tráfico identificadas pelas autoridades na Guatemala, por nacionalidade, de janeiro de 2006 a março de 2008:

País de nacionalidade das vítimas

N° de vítimas identificadas

Nicarágua

414

El Salvador

443

Honduras

259

Colômbia

004

Panamá

005

Outros países A. Central e do Sul

5

Outros

77

Total

1125

                               Fonte: Global Report on Trafficking in Persons, UNODC, 2009

 

6 – O Brasil possui um Disque-Denúncia 100, e o total de denúncias relativas a tráfico somente de crianças e adolescentes foi o que segue no Gráfico:

 

7 – No Estado do Ceará, foi instalado, em 2005, o Escritório Estadual de Prevenção ao Tráfico de Seres Humanos e Assistência às Vítimas. O número de denúncias recebidas é crescente:

Ano

Denúncias recebidas

2005

10

2006

52

2007

11

2008

362

2009

340

2010 (até setembro)

398

Fonte: Relatório do Escritório, Adital, 24/09/10

  

8 – O relatório sobre o Tráfico de Pessoas para a Europa para fins de Exploração Sexual, divulgado no dia 29/06/10, pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), revelou que só na Europa existem cerca de 140 mil mulheres vítimas do tráfico humano que servem àqueles que procuram o mercado da exploração sexual. Por ano também são feitas 70 mil novas vítimas do crime organizado para exploração sexual.

A Organização das Nações Unidas (ONU) estimou que estas 140 mil mulheres traficadas, em condições de servidão, façam, juntas, cerca de 50 milhões de programas sexuais por ano, a um valor médio de 50 euros cada. No total, isso representa um lucro anual que atinge 2,5 bilhões euros, ou seja, o equivalente a R$ 5,5 bilhões.   

Os dados se referem apenas à Europa Ocidental e mostram que a maior parte das pessoas traficadas vem de regiões vizinhas, como os Bálcãs (32%) e países da antiga União Soviética (19%). A América do Sul aparece em terceiro lugar de origem das vítimas, com representatividade de 13%. Segundo o relatório, é cada vez mais crescente o número de brasileiras traficadas. Em seguida, aparece a Europa Central com 7%, África, com 5% e Leste Asiático com 3%.

De modo geral, o estudo aponta a Espanha como o principal país de destino das vítimas, seguida por Portugal, Holanda e Alemanha. Entretanto, o relatório detalhou que as brasileiras e paraguaias, entre as vítimas sul-americanas, são destinadas, principalmente, para Espanha, Itália, Portugal, França, Holanda, Alemanha, Áustria e Suíça. Os dados revelam uma mudança nos últimos anos, pelo menos na Espanha, já que antes de 2003, eram as colombianas, a maioria das vítimas no país.

A estimativa de mulheres traficadas na Europa foi levantada pela ONU com base no número de 7.300 vítimas detectadas na Europa Ocidental em 2006. De acordo com a Organização, apenas 1 em cada 20 vítimas seria detectada, chegando, então, ao total de 140 mil mulheres. O relatório indica que as novas 70 mil vítimas anuais, expressam a rotatividade e o movimento do tráfico de pessoas, e explica que elas substituem aquelas que conseguiram se livrar do crime organizado, abandonando sua antiga condição ou, ainda tenham se transformado em novas aliciadoras.  

9 – Tráfico em Portugal

Já o Relatório Anual de 2009 do Observatório do Tráfico de Seres Humanos, do Ministério da Administração Interior de Portugal, revelou que 40% das mulheres vítimas do tráfico humano em Portugal são brasileiras. Baseado em 85 casos identificados em 2009, o estudo apontou que a maioria dessas mulheres originárias dos estados de Goiás, Minas Gerais e dos estados do Nordeste.

Para o diretor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de Portugal, Manuel Jarmela Paulus, o alto índice de brasileiras entre as vítimas está relacionado apenas ao número expressivo da comunidade brasileira em Portugal – com 100 mil pessoas, ou seja, mais de 20% do total de imigrantes no país. Segundo ele, o Serviço de Estrangeiros está trabalhando em parceria com autoridades brasileiras para combater o tráfico de seres humanos nos dois países.

O relatório de Segurança Interna português também especificou algumas características sobre os traficantes e aliciadores. Geralmente são de nacionalidade portuguesa, romena, brasileira, ucraniana e eslovaca, e para conquistar a vítima, oferecem propostas de trabalho com falsos benefícios. (Fonte: Adital, 02/07/2010, Jorn. Tatiana Félix).

10 – Sobre o Tráfico de Pessoas para fins de remoção de órgãos:

Transcrevo alguns parágrafos do Relatório do Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico, elaborado pelo Ministério da Justiça, divulgado em janeiro de 2010:

“O tráfico de pessoas para fins de remoção de órgãos é um crime altamente complexo, uma vez que envolve profissionais qualificados e instituições de saúde de considerável aparato tecnológico. Nesse tipo de crime, podemos verificar que parte de suas vítimas são pessoas com bom estado de saúde e jovens.

Um dos casos mais relevantes ocorridos no país acerca do assunto ocasionou a chamada “Operação Bisturi”, uma investigação realizada pela Polícia Federal (PF), ocorrida em dezembro de 2003, no Recife. O comprador: um dos maiores pólos médicos do mundo, em Durban, na África do Sul. Os fornecedores: moradores da periferia do Recife. O valor: até US$ 10 mil por unidade. O produto: rins humanos. Esse é o resumo do maior caso de tráfico de pessoas para fins de remoção de órgãos no Brasil, descoberto pela Polícia Federal, que prendeu 11 pessoas, inclusive dois israelenses. A ação transformou em inquérito uma das mais temidas lendas urbanas, a da máfia de retirada de órgãos humanos.

A PF realizava a investigação há nove meses, sendo que o esquema, que funcionava há pouco mais de um ano, consistia em aliciar doadores na periferia do Recife e levá-los até a África do Sul. Lá era realizada a retirada de um dos rins; antes, porém, eles faziam exames em uma clínica recifense, que atestava a boa qualidade do “produto”. Pelo menos 30 pernambucanos venderam o rim à quadrilha e a polícia sul-africana também prendeu três suspeitos.

O esquema foi descoberto por meio da denúncia feita por um homem que iria vender um de seus rins, mas que desistiu antes da viagem. A testemunha contou o que ocorria, em detalhes, à Delegada da Polícia Civil Beatriz Gibson. “Depois de uma súbita viagem, os doadores, pobres e desempregados, compraram caminhões ou montaram pequenos negócios”, relata. Muitos dos que venderam o rim tornaram-se aliciadores e recebiam comissão de R$ 8 mil. “Só eram aceitos candidatos indicados por doadores anteriores, para manter a segurança”, detalhou o Coordenador Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, Ricardo Lins. Ele contou, ainda, que o número de pessoas interessadas em vender o rim cresceu tanto, que os agenciadores, a certa altura, baixaram pela metade o valor pago.

O desfecho do fato resultou numa Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), da Assembléia Legislativa de Pernambuco. A CPI foi instalada para apurar a denúncia de venda de rins, feita por trinta pessoas no Estado.” (p. 25-26)

 

Brasília, novembro de 2010