Desenvolvimento do Projeto
Parte I: Realização do X Encontro da Rede Solidária para Migrantes e Refugiados-RedeMiR
A principal atividade deste projeto é a promoção e realização do Encontro anual da RedeMiR. Em 2014, realizou-se X Encontro. Segue o respectivo relatório.
5.1 Introdução
O X Encontro Nacional dasRedesdeProteção ocorreu de 7 a 9de outubrode2014,em Brasília-DF,comotema “Rede Solidária para Migrantes e Refugiados (RedeMiR): Fortalecimento e Avanços”. O evento foipromovidopeloInstitutoMigraçõeseDireitosHumanos(IMDH), AltoComissariadodasNações UnidasparaRefugiados(ACNUR),Setor Pastoral daMobilidadeHumanadaCNBB e Organização Internacional para as Migrações (OIM),comoapoiodoComitêNacionalparaosRefugiados(CONARE)/MinistériodaJustiça e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Reuniu em torno de 85 pessoas de 42 instituições de todas as regiões do país, e teve o objetivo de resgatar a trajetória da Rede Solidária para Migrantes e Refugiados, contribuir para o fortalecimento da articulação das entidades que trabalham com a questão, e projetar ações e compromissos para consolidar e avançar na acolhida e inserção de refugiados e migrantes na sociedade brasileira (a programação encontra-se em Anexo).
5.2 Acolhida, Apresentação e Mística (08/10/2014, das 08h30 às 10h00)
Coordenada por William César Andrade, a atividade inicial do Encontro consistiu na apresentação dos participantes. De acordo com a procedência, os presentes reuniram-se em grupos por cada região do país com o objetivo de apresentarem-se uns aos outros e avaliarem conjuntamente as principais dificuldades enfrentadas (as “súplicas”), bem como os avanços conseguidos (os “louvores”) na atenção aos migrantes e refugiados.
Após o momento de apresentação, iniciou-se uma atividade de mística, nomeada “Momento da Solidariedade Universal”. O animador (William Andrade) introduziu a intenção do momento (a de saudar a solidariedade e as conquistas existentes em relação à causa dos migrantes e refugiados, mas também a de relembrar as dificuldades que acometeram muitas pessoas em mobilidade), e dois oradores foram escolhidos para evocar tragédias que vitimam/vitimaram migrantes em seus fluxos. Como fechamento, William e Ir. Rosita Milesi (IMDH) voltaram a afirmar e agradecer a rede de solidariedade tecida em torno dos migrantes e refugiados, saudando a presença de todos para o Encontro.
Saudação das entidades (10:30h)
Na breve saudação das entidades promotoras do Encontro, compuseram a mesa Jorge Peraza (OIM), Andrés Ramirez (ACNUR), Ir. Rosita Milesi (IMDH), Pe. Sidnei Dornelas (Setor Pastoral da Mobilidade Humana – CNBB), e João Guilherme Granja (Ministério da Justiça/Conare).
Jorge Peraza cumprimentou os parceiros e organizadores do evento e expôs sua satisfação em constatar o crescimento da RedeMiR. Em seguida, João Guilherme Granja reafirmou o empenho do Ministério da Justiça (principalmente através do secretário Paulo Abrão) em tratar como central a proteção de direitos dos que estão em mobilidade, em aprofundar e ampliar as ferramentas para refúgio, e em honrar a tradição brasileira de abertura ao migrante. Após direcionar um agradecimento a Ir. Rosita Milesi (IMDH), Andrés Ramirez sublinhou a ampliação de instituições participantes do Encontro das Redes, além da presença de associações de migrantes e do representante da Organização Internacional para as Migrações (OIM). Pe. Sidnei Dornelas saudou os presentes em nome do Setor Pastoral da Mobilidade Humana da CNBB, e, seguindo algo destacado pelos outros expositores, reconheceu a importância do trabalho “na ponta” e a relevância do Encontro das Redes de Proteção, por ser ocasião em que se reúnem as instituições que atuam nas bases e os órgãos que prestam serviços relacionados à mobilidade humana. Encerrando esta mesa, Ir. Rosita Milesi externou sua satisfação com a realização do X Encontro, agradeceu a todas as entidades e registrou a diversidade de instituições presentes, assim como a incorporação de novas associações de migrantes.
5.3 Conferência “Cartagena + 30” (11:00h)
Ir. Rosita Milesi (IMDH), mediadora da sessão, apresentou os componentes da mesa: Andrés Ramirez (representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados no Brasil); João Guilherme Granja (diretor do departamento de estrangeiros do Ministério da Justiça, representando o presidente do Conare, Paulo Abrão); Fabrício Toledo de Souza (advogado da Cáritas do Rio de Janeiro). Antes de passar a palavra aos palestrantes, Ir. Rosita introduziu a sessão atentando para o significado da Declaração de Cartagena na caminhada da América Latina na questão dos refugiados e a importância da comemoração de seus 30 anos.
Andrés Ramirez abriu sua fala contextualizando o que fora a Declaração de Cartagena, o porquê de ela ter surgido e os motivos para celebrar seus 30 anos. A Declaração de Cartagena não foi construída por acaso no continente. A América Latina, região aparentemente pacífica, vivenciou, em um passado recente, ditaduras em vários países (Uruguai, Paraguai, Chile, Argentina, Peru etc.) e grandes guerras na América Central (Nicarágua, El Salvador e Guatemala), que levaram a um alto número de pessoas mortas e deslocadas internamente ou que se refugiaram em países vizinhos (como México, Belize, Honduras, Costa Rica). Por causa dos deslocamentos forçados, entidades e governos que trabalhavam com a questão perceberam os limites da Convenção de 1951 de Refugiados, então restrita à perseguição individual. A Declaração de Cartagena de 1984 conseguiu, assim, ampliar a definição de refugiado.
No ano de 1994, em San Jose (Costa Rica), houve a comemoração dos 10 anos da Declaração de Cartagena, já em um contexto bem distinto, em que a principal preocupação relacionava-se ao como chegar a soluções para as pessoas que tinham fugido de seus países. Em 1992, os refugiados guatemaltecos buscaram formas de diálogo com o governo para organizar a repatriação, em um movimento de retorno coletivo e organizado no qual o ACNUR apresentou-se como um instrumento de mediação. Em 8 de outubro desse ano, em um evento histórico, assinou-se um acordo com as condições para esse retorno. A Declaração de San Jose, dois anos depois, contemplaria a comemoração desse esforço por soluções para o tema de refúgio.
Em 2004, no entanto, acompanhou-se uma piora da situação dos refugiados na região devido à guerrilha e toda a situação da Colômbia, a qual, embora existente há mais tempo, intensificara o fluxo de deslocamentos externos a partir do ano 2000 para países da América do Sul e Central (como Costa Rica, Panamá, Venezuela, Equador e Brasil). Completados 20 anos da Declaração de Cartagena, percebeu-se a necessidade de se elaborar também um Plano de Ação, que viria a ser referendado no México. O Plano de Ação México, de 2004, se tornaria, como de fato ocorreu, um marco de referência para os governos guiarem-se na proteção aos refugiados na região.
Comemoram-se, em 2014, os 30 anos da Declaração de Cartagena, e é a primeira vez que ela será celebrada em um país do Cone Sul (Brasil). Novamente, afirma-se não só a importância de se elaborar uma Declaração, como também a de construir um Plano de Ação levando em conta as principais preocupações das diversas sub-regiões do continente latino-americano e do Caribe (este incluído recentemente). Nesse sentido, houve reuniões de consultas sub-regionais em diferentes países: Buenos Aires (março de 2014), em que se encaminharam propostas dos países do Cone Sul a respeito principalmente da necessidade de avançar no tema das soluções de integração local e do reassentamento solidário, além de se levar em conta a questão da apatridia; Quito (junho de 2014), onde se debateu sobre novas formas de soluções duradouras (por exemplo, a proposta do Brasil sobre migração laboral), integração local e negociações entre o governo colombiano e as FARC (levando-se em conta que, em geral, a repatriação não é a escolha primeira dos refugiados colombianos); Manágua (julho de 2014), em que se ressaltou o novo e grave problema relacionado ao deslocamento forçado em razão dos grupos organizados do crime transnacional, sobretudo do triângulo norte da América Central (Guatemala, El Salvador e Honduras), acarretando inclusive no aumento significativo do número de crianças migrantes e refugiadas; Ilha de Grande Cayman (setembro de 2014), em que se abordou a crescente situação de refúgio e migração mista para os países caribenhos, além de propostas em direção à necessidade de se estabelecer um centro temporário de seleção para reassentamento futuro em países solidários da América Latina.
A partir das propostas dos encontros sub-regionais, estão se dando as negociações para a construção da Declaração e do Plano de Ação 2014-2024, processo que se inicia na data de hoje (08/10/14), em Genebra, no marco do Grupo de Países da América Latina e Caribe, para em novembro chegar-se a um acordo entre todas as delegações. Embora não vinculante, a Declaração de Cartagena tem sido um documento assinado de compromisso dos governos, muitos dos quais incorporam princípios fundamentais em suas legislações. Nesse processo de negociação do documento final, destaca-se a forte e importante participação da sociedade civil e as recomendações levantadas por esse segmento nas reuniões de consulta sub-regionais.
Por fim, não é por acaso que o Brasil esteja sediando a reunião neste ano, uma vez que se trata de um país construído por migrantes, incluindo aqueles forçados pelo tráfico escravo. Além disso, o país vivenciou um período histórico de brasileiros que tiveram de fugir de seu país por conta da ditadura. Por esses dois aspectos, o Brasil tem no sangue e nas veias a vontade de ser solidário.
João Guilherme Granja iniciou sua exposição exaltando a construção de espaços de políticas de proteção no Brasil com o protagonismo da sociedade civil, a qual seria precursora do sentimento de responsabilidade com as pessoas em deslocamentos decorrentes de violações de direitos humanos de seus países originários. Atualmente, os próprios Estados muitas vezes são responsáveis por violações desses direitos, então é fundamental a atuação da sociedade civil para se afinar constantemente práticas relacionadas ao refúgio. Para tanto, à sociedade civil não deve somente se garantir a participação social, mas a supervisão social, em que ela acompanha as ações do Estado, questionando a estrutura tradicional em que este tutela, controla e às vezes oculta as situações de violação de direitos humanos de migrantes. Guiado por essa preocupação, o Estado brasileiro busca implementar espaços de supervisão social das políticas para mobilidade humana, dentro das quais se inserem os mecanismos específicos da proteção internacional ao refugiado e, em breve, à pessoa apátrida.
O processo Cartagena +30, conforme ele se referiu durante sua apresentação, privilegiou escutar a sociedade não só como testemunha, mas como orientadora de políticas públicas. Nesse sentido, em 2014 ocorreu a Conferência Nacional sobre Migrações e Refúgio no Brasil, com o engajamento de entidades não-governamentais e solicitantes de refúgio, fundamental para o aperfeiçoamento de ações futuras tendo em conta que o Estado brasileiro é consciente de que ainda apresenta obstáculos para a implementação de políticas sobre o tema.
Retomando antecedentes de Cartagena +30, apontou para os ciclos decenais surgidos a partir da Declaração de Cartagena sobre Refugiados de 1984, quais sejam: San Jose da Costa Rica, em 1994; México, em 2004; e Brasil, em 2014, ocasião em que culminará a construção da Declaração e do Plano de Ação Brasil.
O processo Cartagena +30 engloba a realização de consultas sub-regionais realizadas em 2014 na América Latina e Caribe, em que os principais temas trabalhados foram: a qualidade de sistemas de refúgios, o reconhecimento da situação de refugiado, os fluxos migratórios mistos, a questão da apatridia, a necessidade de proteção das pessoas que se deslocam em razão da incidência do crime organizado, a superação do dilema entre a segurança nacional e as obrigações humanitárias, e as iniciativas inovadoras com relação aos programas de mobilidade. Em cada encontro, preparou-se uma carta-síntese, com o objetivo de atualizar os Planos de Ação.
O evento Cartagena +30 ocorrerá nos dias 2 e 3 de dezembro de 2014 em Brasília, com a representação dos Estados da região, dos países que participaram das consultas, dos organismos internacionais e da sociedade civil. Nele, buscar-se-á organizar um marco não apenas declaratório, mas que implante mecanismos de cooperação, efetivação de políticas e de resposta às novas demandas que a sociedade civil e os solicitantes de refúgio apresentem ao Estado brasileiro, base para se pensar o decênio 2014-2024, a ser pautado pelo objetivo de aprofundamento e expansão dos mecanismos de proteção.
Por fim, retomando pontos expostos, Granja aludiu à situação dos diagnósticos complexos apresentados na Conferência Nacional sobre Migração e Refúgio, à tentativa de ampliação dos canais de escuta e de supervisão social (como a implantação do Comitê de Acompanhamento pela Sociedade Civil, o CASC, no âmbito do Ministério da Justiça), e à constatação de que a Política Nacional de Refúgios brasileira insere-se em regime jurídico migratório perverso, excludente e às vezes contraditório com políticas de proteção internacionais. Nessa direção, os desafios são: superar a assimetria entre as ferramentas à disposição do Estado brasileiro para lidar com os refugiados e o Regime Geral de Migrações brasileiro; e alterar o perfil institucional que lida com o refúgio (atualmente realizado por um órgão policial) em direção a um órgão específico civil e especializado no contato com solicitantes refugiados, imigrantes e emigrados brasileiros retornados.
Fabrício Toledo de Souza indicou que o tema da mesa sintonizava-se com um texto escrito coletivamente pela Cáritas do Rio de Janeiro sobre a definição ampliada de refugiado nos termos da Declaração de Cartagena, e que também dizia respeito diretamente ao trabalho realizado pela Cáritas no atendimento aos refugiados e solicitantes. A lei brasileira 9474 assimilou de forma peculiar o conceito de refugiado de uma maneira ampliada, quando definiu em seu inciso III do art. 1º, “vítima de grave e generalizada violação de direitos humanos”. O texto original da Declaração de Cartagena falava da proteção das pessoas que deixavam seus países porque sua vida, segurança ou liberdade haviam sido ameaçadas pela violência generalizada, pela agressão estrangeira, conflitos internos, violação de direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública. O artigo elaborado pela Cáritas era uma compilação sobre as críticas que especialistas do ACNUR faziam à aplicação do conceito ampliado (Cartagena) na legislação interna de cada país.
A partir desse panorama, Souza enunciou o objetivo de, em sua apresentação, abordar um caso concreto atendido pela Cáritas do Rio de Janeiro e como essa questão do refúgio é posta. Sobre isso, o processo de Cartagena +30 deve ser entendido como algo dinâmico, e, portanto, que lança o desafio de atualizar o conceito ampliado de refúgio face aos problemas de hoje. Dentre eles, mencionou a mudança da forma da guerra e da violência no mundo, pois não há mais guerras declaradas entre Estados como no passado, mas conflitos e intervenções dentro dos territórios; e a limitação da classificação entre migrante/refugiado, muito mais tênue e híbrida na prática, e que, não sendo assim considerada, acaba restringindo direitos. O processo Cartagena é a oportunidade de reavaliar a aplicação do conceito de refúgio pelo Estado brasileiro e pensar a definição nos nossos termos, ou seja, quais são os fluxos que chegam ao Brasil e quais são as reponsabilidades do Estado nesse panorama.
À luz dessa revisão, apresentou a situação concreta dos migrantes da República Democrática do Congo, que se constituem no maior número de solicitantes de refúgio no Rio de Janeiro. Desde 2006, é um país que apresenta uma das piores guerras do mundo, com 6 milhões de mortos, 4 milhões de deslocados internos e aproximadamente meio milhão de refugiados. O que se ouve no atendimento a esses refugiados e solicitantes são histórias de terror, sobre aldeias atacadas por grupos rebeldes, populações inteiras que se tornaram reféns desses grupos ou da própria força de segurança nacional, extermínios de tribos, mortes de crianças, mutilações, estupros coletivos, guerras étnicas etc. Congo é considerado, hoje, o pior país para uma mulher viver e não há nele instituições que se possam denominar democráticas. Mas essa é só a parte mais visível do terror para quem trabalha com o tema do refúgio, pois há uma parte mais escondida da história ouvida nas conversas informais com os refugiados a respeito de uma sociedade totalmente atravessada pela violência e pela guerra e que gera também consequências como o grande número de vítimas de doenças simples de serem tratadas, como a diarreia e febre, mulheres que morrem no parto, miséria, fome, desemprego e cerceamento da liberdade de expressão, dentre outros. Nesse contexto, é raro que alguém ultrapasse 45 anos. A guerra, portanto, não é aquela feita apenas por soldados, mas é toda essa forma de violência que modula as relações sociais, que transforma cada diferença em conflito mortal, que coloca a vida sempre como uma questão de mera sobrevivência.
Perante situações como esta o que interessa para as entidades que trabalham com solicitantes de refúgio em relação à Declaração de Cartagena é a possibilidade de atualizar o instituto de refúgio de forma que ele se torne justo diante dos problemas de nossa região – e por “nossa região” não se deve entender apenas a relação do Brasil com a América Latina, mas também com o continente africano. Trata-se de uma proposta de retomada da Declaração de Cartagena, fortalecendo sistemas complementares de proteção e sistemas de determinação e status que sejam mais pautados pela objetividade (ou seja, análise mais objetiva dos casos em lugar da investigação subjetiva). Por fim, tem-se a esperança de que o instituto de refúgio refira-se a um direito que diga respeito à vida em sua condição reativa, mas também na sua condição afirmativa, uma vida em sua dignidade plena. O mecanismo de proteção eficiente e justo seria aquele que realmente considera as razões objetivas do país de origem, não apenas da perspectiva do Estado que acolhe, mas também do ponto de vista das pessoas que fogem.
5.4 Exposições “Novos fluxos migratórios” e “Ações do CNIg/MTE na área do trabalho, face aos novos fluxos migratórios para o Brasil” (14:00h)
A mesa foi composta por Jorge Peraza (Organização Internacional para as Migrações/OIM) e Paulo Sérgio de Almeida (Conselho Nacional de Imigração/CNIg do Ministério do Trabalho e Emprego/MTE), e moderada pelo Pe. Marcelo Monge (Cáritas de São Paulo).
Com o tema “Novos fluxos migratórios”, Jorge Peraza iniciou sua exposição com o questionamento: o que acontece no mundo que impulsiona, hoje, as pessoas a se deslocarem? Aludindo às notícias internacionais diárias no último mês envolvendo situações de migração, demarcou como é intenso o fenômeno migratório no plano global e como há uma dificuldade dos países que recebem em lidar com a questão em seu todo.
O panorama econômico mundial não deixa ver perspectivas diferentes. De forma não alentadora, índices de desigualdade entre países com mais e menos dinheiro vêm aumentando; a perspectiva de crescimento econômico de países da América Latina foi rebaixada pelo FMI; e, no mercado mundial, empresas transnacionais buscam se instalar em locais mais baratos para produzir, pagando salários mais baixos. Além disso, a partir de um trabalho realizado por OIM e CNIg sobre a imigração haitiana no Brasil, levantaram-se os impactos de fatores ambientais e de mudanças climáticas para a migração (como no caso do terremoto de 2010). Ou seja, há uma combinação de fatores que influem hoje para o deslocamento de pessoas, de modo que, no caso do Brasil, é muito difícil precisar a tendência migratória (se vai aumentar ou refluir).
Os novos fluxos migratórios devem ser pensados nesse panorama e em uma perspectiva de dinamismo. Historicamente, o Brasil acolheu muitos fluxos migratórios, mas, pelas estatísticas, segue tendo uma porcentagem pequena de migrantes face à sua população total e comparando-se com outros países. Não obstante, é fundamental estabelecer políticas e marcos regulatórios para que esses fluxos se deem do modo mais adequado e para que não haja distinções de tratamento entre migrantes, como se houvesse migrantes “desejáveis” e “indesejáveis”. Ante esses fluxos, e se temos uma política de abertura às migrações, é necessário assegurar que ela seja de fato para todos – algo que não prática não vem ocorrendo.
Além disso, é fundamental avançar na postura que os Estados seguem tendo em relação à sua soberania e segurança nacional. Existem critérios, como o de saúde pública, que podem levar um país a restringir ou mesmo impedir a entrada de migrantes em seu território e o tema do ebola tem evocado sinais nessa direção. No entanto, sabe-se que se são postas políticas migratórias restritivas, os fluxos migratórios continuarão se dando, porém às escondidas.
Lamentavelmente, o contexto atual parece às vezes não favorecer que os processos migratórios se deem dentro de um marco de direitos adequado. É importante refletir o quanto o crescimento econômico ou o não-crescimento global influem no aumento da xenofobia e políticas mais restritivas, como o endurecimento do controle de entrada de migrantes. Ante essas políticas restritivas, não é de se estranhar a emergência de problemas relacionados com o tráfico de seres humanos e de grupos de pessoas que lucram com a demanda de migração frente a aparelhos coercitivos nas fronteiras.
Em relação ao futuro, na América Latina, existem países em que as taxas de desemprego vêm aumentando fortemente. Tais situações lançam a interrogação sobre a ativação de novos fluxos regionais e para fora da região latino-americana. O que se tem mais claro é que, ante o aumento de políticas restritivas, pode-se esperar que se deem mais fluxos migratórios em situações inadequadas. Os países que eram tradicionalmente destino desses migrantes incrementaram seus controles, obrigando os migrantes a explorarem novas rotas. O Brasil está sendo parte dessas novas rotas.
Outra interrogação é se os dispositivos internacionais de defesa dos direitos dos migrantes são capazes de responder às novas situações. Pergunta-se se não teria chegado o momento de se criar um quadro normativo internacional capaz de responder de maneira mais coerente e clara, pois, embora haja vários dispositivos de proteção (como a Convenção de Proteção dos Trabalhadores Migrantes, os Protocolos de Palermo, disposições em nível interamericano, a resolução para o tema das crianças desacompanhadas, a Convenção para os Direitos das Crianças), eles encontram-se dispersos. É preciso um marco mais consolidado em matéria migratória – e isso, novamente, choca-se com a apelação de muitos Estados em seguir mantendo sua soberania, o que leva a não se discutir o assunto em fóruns multilaterais ou bilaterais.
A exposição seguinte, de Paulo Sérgio de Almeida, versou sobre o assunto “Ações do CNIg/MTE na área de trabalho, face aos novos fluxos migratórios para o Brasil” e foi aberta com um reconhecimento ao trabalho de associações e entidades da sociedade civil na recepção e construção dos mecanismos legais de defesa dos direitos dos migrantes – fundamental em um contexto em que o Estado ainda não conseguiu, de maneira estabelecida, a acolhida adequada aos migrantes.
Em seguida, ateve-se à sinalização de um novo cenário vivido no Brasil com relação à questão migratória, associado a mudanças internas por que vêm passando o país. Essas mudanças internas seriam: um nível de emprego estável, apesar do quadro de crescimento econômico extremamente baixo; crescimento do valor real do salário mínimo, com a melhoria da condição dos trabalhadores brasileiros; e redução do processo de desigualdade. Esse quadro produz um cenário mais atrativo para a vinda dos migrantes, aliado também às dificuldades enfrentadas por países que eram destino mais tradicional dos fluxos. Assim, o Brasil apresenta-se como uma nova rota; não à toa aumentou o número de migrantes recebidos em 2008, durante a crise mundial, invertendo inclusive seu fluxo migratório.
Outra mudança é que, nessa conjuntura nacional, há um novo olhar em relação às migrações: os migrantes deixam menos de ser vistos sob a perspectiva de ameaça à segurança nacional ou como um peso a mais no mercado de trabalho, para ser mais pensados como pessoa humana, sujeitos de direitos e promotores também de desenvolvimento do país. Sinal disso é que os fluxos migratórios que afluíram para o Brasil não foram combatidos. O CNIg tem colaborado nessa nova visão, com a produção de documentos sobre os direitos dos migrantes e sua contribuição para a economia do país.
Mas ainda há a tensão entre visões sobre migrações (direitos humanos versus segurança nacional) e é necessário consolidar uma nova política migratória para o Brasil. As políticas devem enfatizar as motivações das migrações, e novamente o trabalho assume posição de destaque, por ser a força propulsora dos principais fluxos migratórios. Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), dos 230 milhões de migrantes no mundo, 90% é formada por trabalhadores e pessoas que buscam um trabalho decente.
A própria OIT percebe que existe a necessidade de reforçar o quadro institucional que apoia e defende os direitos dos trabalhadores migrantes. As convenções que vêm postulando essa nova visão do trabalho, em sua maioria, são devedoras da reflexão de organismos tripartites (governos, trabalhadores e empregadores). Nas convenções da OIT existe uma preocupação crescente em afirmar os direitos dos trabalhadores migrantes e o reconhecimento do valor de seu trabalho (a exemplo da recente Convenção 189, referindo-se aos trabalhadores domésticos); no entanto ainda são poucos seus Tratados que falam das migrações.
Assim, o trabalho deve ter papel central em uma futura institucionalidade sobre migrações. Embora com legislação ultrapassada, o Brasil dá alguma resposta face aos novos fluxos migratórios, estimulando a parceria entre os diversos órgãos governamentais e outras organizações. Exemplo disso foi o primeiro grande desafio enfrentado pelo país com relação ao tema, qual seja, o fluxo recente de migrantes haitianos e a decisão de dar-lhes a acolhida humanitária, com destaque para a criação e emissão de vistos humanitários por parte do Conare e CNIg (Resolução Normativa 97/2012).
No mesmo sentido, existe uma preocupação em atender de maneira mais adequada a chegada de migrantes senegaleses, paquistaneses, bengalis, entre outros. Mesmo que eventualmente negada sua condição de refugiados, é necessário compreender a situação desses migrantes, que permanecem inseridos no território do país pelo exercício do trabalho. O CNIg, em acordo com o Conare, vem buscando acompanhar a situação desses trabalhadores migrantes no que se refere à regularização de sua documentação. Mas não se sabe o que irá ocorrer com novos solicitantes enquanto não se aprovar uma nova legislação sobre migrações que garanta mecanismos de documentação.
Essa incerteza na legislação gera dificuldades preocupantes, pois retardam a formulação de políticas de acolhimento mais bem definidas, de regularização da situação de migrantes, de prestação de melhores serviços a eles, e de suporte aos estados e municípios – o que vem a onerar o sistema de assistência social brasileiro.
Finalizando, Almeida observou que não é verdadeira a associação imediata de migrantes a trabalhadores escravos, uma vez que as situações flagradas pelo MTE abrangem também brasileiros. O CNIg, em parceria com governos estaduais, vem promovendo uma discussão ampla sobre as condições de inserção no trabalho dos migrantes. Com base em todas essas questões, tem insistido na elaboração da Política Nacional Migratória e tem defendido que o Brasil ratifique o Tratado Internacional sobre os direitos dos migrantes (Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros de suas Famílias), tomando-o como a referência principal para a formulação do quadro legal de defesa desses trabalhadores.
5.5 Exposição “Iniciativas e processos legislativos em trâmite atualmente na área de migrações” (17:00h)
A mesa seguinte contou com a apresentação de Marcia Sprandel (assessora do Senado Federal) e foi coordenada por Gabriel Godoi (advogado, assistente de proteção no ACNUR).
Marcia Sprandel abriu sua fala ressaltando a importância da pressão política da sociedade sobre o Legislativo. Com o recurso de uma exposição em power point, a apresentação foi dividida em duas partes: a primeira, sobre o que está tramitando hoje na Câmara dos Deputados e no Senado Federal a respeito dos temas “migrações” e “estrangeiros” (sendo o segundo tópico mais representativo do que o primeiro); a segunda, sobre a importância do trabalho de advocacy/lobby no Congresso, o qual tende a ser visto sob uma conotação negativa devido aos lobbies empresariais. Porém, há um lobby “do bem” que precisa ser feito porque os parlamentares funcionam muito no corpo a corpo, no contato pessoal.
Em outubro de 2014, havia 106 matérias (ou seja, Projetos de Lei ou Propostas de Emenda à Constituição) no Congresso Nacional que tratavam de migrações ou estrangeiros. Na Câmara, são 73 matérias, tais como os PLs que buscam alterar a Lei 6815/80 (Estatuto do Estrangeiro) ou que versam sobre residência provisória, visto de permanência, extensão aos estrangeiros de benefícios sociais, ampliação dos direitos dos brasileiros no exterior, direitos de trabalhadores estrangeiros no Brasil, reconhecimento de profissão e diploma, aquisição de terras por estrangeiros, tráfico de pessoas e inclusão de estrangeiros no Livro dos Heróis da Pátria. No Senado, são 33 matérias, tocando assuntos como alteração do Estatuto do Estrangeiro, ampliação dos direitos dos estrangeiros, sobre trabalhadores em embaixadas, sobre a instalação do escritório da OIM (que se encontra na Comissão de Relações Exteriores), etc.
As PECs (Propostas de Emenda à Constituição), tanto na Câmara como no Senado, visam ampliar os direitos políticos dos estrangeiros, no sentido de poderem ser eleitores e elegíveis (referentes ao Art. 5º, Art. 12, Art. 14 e Art. 45 da Constituição Federal). Atualmente, o estrangeiro no Brasil não vota e não pode ser votado; a mudança dessa situação é uma demanda antiga, pois enquanto os migrantes não votarem, não terão força no Congresso (e é possível que a PEC 325/2004, de J. Boeira, do PT/SC, seja votada ainda este ano). Dada a semelhança de conteúdo entre várias PECs, há uma tendência de as mesmas serem apensadas e se transformarem em uma só proposta para dar celeridade ao processo. No entanto, elas ficaram paradas por muito tempo, pois a força política do estrangeiro é muito pequena no Congresso. Por isso, novamente, a mobilização da sociedade pela aprovação das matérias é muito importante para quebrar essa inércia.
Além disso, foram mencionadas as PECs que ampliam os direitos políticos de estrangeiros no exterior (uma na Câmara e outra no Senado), e que tratam de permitir, aos brasileiros residentes fora do país, o voto também para deputados.
No Congresso Nacional, tramitam também projetos de alteração do Código Penal relacionados a migrantes. Nos anos de 2012 e 2013, criou-se uma comissão no Congresso para alterar todo o Código Penal. Nesse período, elaborou-se uma proposta até então inexistente no Código Penal em vigor: um capítulo só sobre crimes relativos a estrangeiros. Hoje, no Código Penal, quando se faz referência ao estrangeiro, os tipos penais estão distribuídos e não reunidos como uma questão só. Porém, segundo o Projeto de Lei do Senado 236/2012 (José Sarney), cria-se o título específico “XIV. Dos Crimes Relativos a Estrangeiros”. Segundo Sprandel, essa proposta é muito negativa, pois institui um título próprio para ligar estrangeiro a criminalidade – tanto que, quando divulgada, várias entidades se posicionaram contrariamente a ela. No entanto, apesar das críticas, o relator só acatou um artigo relativo a refugiados; o resto do texto manteve-se e está pronto para ser votado no plenário. Há vários artigos problemáticos, tais como os relacionados a “Introdução Clandestina” e “Declaração Falsa”, que podem enquadrar qualquer pessoa que abriga um estrangeiro.
Em seguida, abordou-se o Projeto de Lei 7370/2014, que juntou propostas da CPI do tráfico de pessoas da Câmara e do Senado, e cujo relator é o deputado Jordy. O PL propõe mudanças no Estatuto do Estrangeiro (para que a vítima do tráfico de pessoas tenha direito a visto permanente, e para que o estrangeiro permaneça em situação regular no país enquanto tramitar seu pedido de regularização), apreciados positivamente pela expositora.
Há também propostas de alteração total do Estatuto do Estrangeiro, que é uma legislação antiga, de 1989. Apesar de ela estar sendo atualizada por resoluções do CNIg, há um interesse grande que ela mude. Nessa direção, há o PLS (Projeto de Lei do Senado) 288/2013 (já aprovado em duas Comissões); há o PL 5655/2009, proposto pelo governo Lula, que já está há muito tramitando e talvez tenha perdido algo de sua atualidade em função das resoluções do CNIg e Tratados do Mercosul; e há uma terceira proposta de uma comissão de especialistas criada pelo Ministério da Justiça de uma nova lei de estrangeiros, que está em discussão no CNIg. Quando esta última proposta for de consenso, um parecer dela poderia ser apresentado na Comissão de Relações Exteriores como um substitutivo, e muito se poderia ganhar em termos de processo legislativo.
Por fim, retomando a importância do trabalho de advocacy ou lobby junto a deputados e senadores, Sprandel recomendou a leitura do “Guia para orientar ações de Advocacy no Congresso Nacional”, produzido pela OIT e disponível na internet (www.oit.org.br). O guia oferece orientações sobre a estrutura, os procedimentos e os ritos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, visibilizando os caminhos possíveis para ações de advocacy. Essas orientações são importantes para poder dialogar e falar de igual com os políticos. Advocacy é uma atividade legítima, pois é próprio da democracia o processo de negociação.
Antes de abrir o espaço de perguntas, o mediador Gabriel Godói ressaltou o fato de estar em trâmite no Congresso a adesão pelo Estado brasileiro à Convenção da ONU sobre os Direitos dos Trabalhadores e seus familiares, além do andamento de propostas que modificam o Estatuto do Estrangeiro para ampliar os direitos políticos destes no Brasil, e projetos que estão ligados a uma nova política migratória. As instituições que trabalham com migração têm uma concordância de que é necessária uma política que contemple um plano nacional de acolhimento para o estrangeiro, migrante ou refugiado – inclusive esta foi uma recomendação da Santa Sé ao Estado brasileiro em Genebra, em 2012, no Conselho de Direitos Humanos da ONU. Dentro desse marco político, foi elaborado um anteprojeto de lei sobre determinação da condição de apátrida – e a mobilização da RedeMiR foi importante nesse sentido. Godói problematizou também o título XV do Projeto de Lei do Senado 236/2012 face à definição de que modelo de hospitalidade quer-se construir no país. A inauguração de um título “Dos Crimes relativos a Estrangeiros” no Código Penal, ao criar novos crimes para punir condutas que já estão no Código Penal hoje, parece acabar consolidando um raciocínio de ver o estrangeiro como inimigo potencial.
5.6 Exposições “Participação social: legislação e debate” e “Vamos encontrar nossas crianças (prevenção ao tráfico)” (09/10/2014, às 15:30h)
A mesa foi moderada por Cyntia Sampaio (OIM) e teve as exposições de Paula Pompeu Laís Mendonça, em um primeiro momento, e Ricardo Paiva (Conselho Federal de Medicina), em um segundo momento.
A primeira exposição foi feita por Paula Pompeu e Laís Mendonça com o tema “Participação social: legislação e debate”. Sobre migração e políticas públicas, mencionaram-se as novas implicações do fenômeno migratório no contexto da globalização do capital e fechamento de fronteiras; a questão da migração tratada na perspectiva da cidadania e dos direitos humanos; e o aumento da migração para o Brasil, bem como as implicações em termos de políticas públicas.
As políticas públicas podem ser influenciadas pela participação social. O direito à moradia, direitos da infância e juventude, política solidária, estatuto da juventude, estatuto da igualdade racial resultaram de demandas vindas dos movimentos sociais. Entre os espaços institucionalizados de participação social, destacam-se: conselho de políticas públicas; comissão de políticas públicas; conferência nacional; ouvidoria pública federal; mesas de diálogo; fórum inter-conselhos; audiência pública; consulta pública.
A migração é um tema intersetorial que abarca e pode ser abordado em diferentes espaços de participação. Cada espaço institucionalizado, tendo uma finalidade própria para a participação, não está isolado dos demais e não pode estar descolado dos outros processos em andamento.
Mas há dilemas dos espaços institucionalizados de participação social. Nos conselhos e comissões de políticas públicas nem sempre as regras de seleção dos participantes são suficientemente abertas, e pode haver representantes com pouca conexão com os movimentos sociais de base. Em conferências nacionais, há dificuldade para monitorar os resultados dos processos e cobrar os seus resultados. Audiências e consultas públicas algumas vezes ocorrem quando as principais decisões já foram tomadas.
Dentre os Conselhos Nacionais que podem tratar da questão migração, foram citados: Conselho Nacional de Imigração (CNIg); Conselho Nacional dos Direitos Humanos; Conselho Nacional de Erradicação de Trabalho Escravo; Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial; e o Conselho Nacional de Assistência Social.
Fez-se também um apanhado sobre as Conferências Nacionais que discutiram o tema da migração entre os anos de 2003 e 2012. Nesse período, ocorreram 88 conferências nacionais, e em 13 delas foram identificadas propostas de promoção dos direitos dos migrantes e refugiados (65 proposições no total). Essas propostas surgiram, por exemplo, nas I e II Conferências Nacionais de Promoção da Igualdade Racial (realizadas em 2005 e 2009) e nas IX e XI Conferências Nacionais de Direitos Humanos (em 2004 e 2008). Dada a baixa incidência da temática migratória nas conferências, questionou-se se há falta de representação de migrantes e refugiados, invisibilidade do tema para a sociedade como um todo ou proibições relativas à participação social dos migrantes.
Ainda sobre o tema migratório, tomou-se o exemplo de São Paulo, que realizou a audiência pública “Acesso à Cidadania, Direitos Civis e Participação Política dos Imigrantes”, requisitada pelo Fórum Social pelos Direitos Humanos e Integração dos Migrantes no Brasil. Neste município, cada subprefeitura que apresenta pelo menos 0,5% de estrangeiros em sua população abriu uma vaga de conselheiro, que cumpre o papel de exercer o controle social sobre planejamento, ações e gastos públicos e sugerir políticas públicas.
Por fim, mencionaram a importância também da participação social em espaços não institucionalizados, por ser a única forma de garantir a autonomia da sociedade civil, por ser necessária para definir as demandas de associações e movimentos antes de partir para os espaços de diálogo e negociação e posicionar-se frente ao poder público, e por ser necessária para fazer com que os representantes da sociedade civil realmente a representem. Entre as formas de participação não institucionalizadas, foram citadas associações, movimentos sociais, confederações, fóruns redes e articulações.
Em seguida, Ricardo Paiva apresentou o tema “Vamos encontrar nossas crianças (prevenção ao tráfico)”. Iniciou sua exposição observando que é impossível quantificar o número de crianças desaparecidas no mundo, mas a UNICEF calcula algo em torno de 2,2 milhões. Estima-se que 1,2 milhão de crianças sejam traficadas por ano, fundamentalmente para realizarem trabalho escravo.
Os modos de desaparecimento são, por ordem, fuga decorrente de maus tratos, rapto, abandono, e sequestro. As crianças desaparecidas são alvo de exploração sexual/pedofilia, adoção (venda), trabalho escravo e extração (comércio) de órgãos.
No panorama internacional, a maior parte dos desaparecimentos se dá na África e Ásia. Nos EUA, 450.000 crianças desaparecem por ano.
No Brasil, foi realizada uma Comissão Parlamentar de Inquérito, sob relatoria da deputada Andreia Zito (PR), para investigar o desaparecimento de crianças. Dessa CPI, resultaram ações como: a Lei Federal n° 11.259/2005, conhecida como lei de busca imediata; a criação de um cadastro nacional de crianças desaparecidas (em que atualmente constam 1.600 cadastrados, número considerado desatualizado); a iniciativa de criar banco de DNAs; e a ferramenta de envelhecimento digital (embora apenas o Paraná a possua).
São registrados em média 50.000 casos anuais de desaparecimento de crianças no país. Desses, 25% referem-se a São Paulo, estado que apresenta o maior índice de desaparecimento, seguido por Rio de Janeiro. As fugas de casa compreendem a causa de 76% dos casos, muitas vezes associadas a maus tratos e alcoolismo. O governo brasileiro reconhece que 10 a 15% das crianças desaparecidas não são reencontradas.
Entre as ações de prevenção ao desaparecimento de crianças, mencionaram-se: ensinar desde cedo à criança o nome completo do pai e da mãe; tirar o quanto antes o RG da criança; orientar a não dar informações ou receber presentes de qualquer desconhecido que se aproxime; conversar sempre com os filhos e conhecer as pessoas que convivem com eles; às pessoas que necessitam de atenção especial, garantir que levem sempre dados de identificação consigo; atentar ao uso que os filhos fazem de computadores com internet, etc.
Em casos de desaparecimento, recomenda-se buscar as seguintes instituições: delegacia mais próxima; disque 100;Rede Nacional de Identificação e Localização de Crianças e Adolescentes Desaparecidos (tel.: (61) 3429-9336); Serviço de Busca de Paradeiro da Cruz Vermelha (tel.: (21) 2221-0658); e Polícia Federal (denúncias sobre tráfico de seres humanos). Citaram-se também o ICMEC e o Missing Kids, organizações que integram redes de resgate a crianças desaparecidas, constituídas por diversos países americanos e europeus.
Em relação à atuação de médicos, Paiva sugere a criação de um cadastro latino-americano associado a centros de divulgação internacional.
Após as exposições, foi aberto espaço para debate.
5.7 Trabalho em grupos e encaminhamento da síntese: “Acolhida, integração de imigrantes e incidência em políticas públicas: priorização de propostas” (10:00h)
Foi apresentada uma matriz de propostas recolhidas da prática e das pendências não atendidas ao longo dos dez anos de atuação da RedeMiR. Essa matriz trazia 11 propostas de diferentes áreas. Cada grupo regional priorizaria as propostas, destacando as 3 de maior importância e listaria ações para sua efetiva implementação, assinalando inclusive se tais propostas seriam de responsabilidade local ou nacional.
Os trabalhos foram sistematizados nos quadros a seguir.
Grupo de Trabalho da Região CENTRO-OESTE
Ordem | Área Temática | Propostas sintetizadas |
Ações de Incidência da Sociedade Civil |
Âmbito |
1 | Legislação | Adotar uma nova Lei de Migrações, ratificação da Convenção dos Trabalhadores Migrantes e aprovação da PEC que permita o voto aos estrangeiros residentes no Brasil. | – Organizar uma equipe no estado que faça a interlocução com os deputados e senadores na defesa da legislação (sobre migração). | Local e Nacional |
– Promover reuniões e debates sobre os temas de legislação sobre migração. | Local | |||
2 | Trabalho, Inserção Laboral e Empreendedorismo | Criar mecanismos para prevenir a exploração no trabalhador migrante e refugiado e para facilitar o acesso de dos mesmos ao mercado de trabalho formal: documentação, intermediação de mão de obra, qualificação profissional, empreendedorismo. | – Estabelecer termo de cooperação técnica com a Superior Regional de Trabalho. | Local |
– Estabelecer parcerias com instituições afins. | Local | |||
– Produzir e divulgar informações escritas/impressas em outros idiomas, para trabalhadores e empregadores. | Local e Nacional | |||
3 | Educação e Cultura |
Educação: Ampliar e divulgar os cursos de português e cultura brasileira para migrantes e refugiados. Cultura: Estimular a produção cultural das comunidades migrantes residentes no Brasil, e favorecer ambiente intercultural voltado à interação harmoniosa entre os migrantes e a sociedade brasileira. |
– Propor às universidades, escolas públicas e institutos Técnicos Federais, a criação e/ou ampliação de cursos de língua portuguesa. | Local e Nacional |
– Organizar eventos culturais, integrando os migrantes e refugiados à sociedade brasileira (elaborar calendário de eventos culturais). | Local |
Grupo de trabalho da REGIÃO SUDESTE
Ordem | Área Temática | Propostas sintetizadas |
Ações de Incidência da Sociedade Civil |
Âmbito de Atuação |
1 | Legislação | Adotar uma nova Lei de Migrações, ratificação da Convenção dos Trabalhadores Migrantes e aprovação da PEC que permita o voto aos estrangeiros residentes no Brasil. | – Fortalecer a participação de imigrantes e refugiados(as) em esferas públicas de deliberação e promoção dos direitos. | Local e Nacional |
– Propor alterações em uma das PEC’s, e logo que a mesma representar-nos da melhor maneira, apoiar sua aprovação. | Local e Nacional | |||
2 | Saúde | Garantir o acesso à saúde básica, preventiva e atendimento específico à população de interesse na chegada ao país (vacinas, exames laboratoriais e tratamento emergencial, entre outros). | – Sensibilizar os trabalhadores das UBS com palestras e encontros de formação. | Local e Nacional |
– Incidir para que o Ministério da Saúde elabore e distribua cartilhas informativas sobre as doenças e os mitos relacionados à população migrante. A sociedade civil pode sugerir tópicos relevantes para a comunidade migrante com base na experiência acumulada e nas realidades regionais. | Local e Nacional | |||
3 | Trabalho, Inserção Laboral e Empreendedorismo | Criar mecanismos para prevenir a exploração no trabalhador migrante e refugiado e para facilitar o acesso de dos mesmos ao mercado de trabalho formal: documentação, intermediação de mão de obra, qualificação profissional, proteção do trabalhador e empreendedorismo. | – Publicar em outros idiomas o “Guia sobre trabalho no Brasil para haitianos” e distribui-lo amplamente entre os migrantes e refugiados. | Local e Nacional |
– Estabelecer parcerias com o MPT e demais órgãos relacionados ao trabalho e emprego para desenvolver as seguintes atividades: *Sensibilização e prevenção da exploração; *Parceria com o ‘’Sistema S’’ *Influenciar na qualificação dos SINES e na sensibilização de seus funcionários; *Sensibilização das universidades quanto à validação dos diplomas dos(as) imigrantes/refugiados/apátridas e brasileiros retornados. |
Local e Nacional |
Grupo de trabalho da REGIÃO NORDESTE
Ordem | Área Temática | Propostas sintetizadas |
Ações de Incidência da Sociedade Civil |
Âmbito de Atuação |
1 |
Abrigo Temporário, Locais de acolhida |
Abertura de novas unidades de acolhida temporária para receber migrantes e refugiados chegados ao país, atenção especial a grupos familiares. |
– Fortalecer a rede de parceiros locais. | Local |
– Articular-se com atores do poder público, em especial, a Secretaria de Assistência Social para provocá-lo para a causa, pois os abrigos têm uma estrutura voltada para abrigar a população em situação de rua e não respondem às especificidades da população migrante. | Local | |||
– Estabelecer um recurso para ser gerenciado pela sociedade civil para o acolhimento do/da migrante. | ||||
– Fortalecer os locais de acolhida para fornecer informações básicas necessárias para os migrantes. | Local | |||
2 | Educação | Ampliar e divulgar os cursos de português e cultura brasileira para migrantes e refugiados | -Estar atento às necessidades específicas de mulheres e crianças por ocasião da oferta de cursos de português e de cultura brasileira. | Local |
– Incidir junto à Secretaria de Educação para a multiplicação de locais de aula mais próximos à moradia da população migrante. | Local | |||
– Articular com os Institutos Federais para aberturas de turmas para migrantes (por meios de convênios). | Local | |||
– Realizar ações educativas para aumentar o interesse da população migrante nas aulas, destacando a importância do certificado do aprendizado do idioma português e também realizar uma pesquisa sobre as causas das faltas dos migrantes às aulas oferecidas. | Local | |||
– Aliar as aulas de português ao ensino/debate sobre direitos e deveres (Lei Maria da Penha, ECA, Disque 100). | Local | |||
3 | Trabalho, Inserção Laboral e Empreendedorismo | Criar mecanismos para prevenir a exploração no trabalhador migrante e refugiado e para facilitar o acesso de dos mesmos ao mercado de trabalho formal: documentação, intermediação de mão de obra, qualificação profissional, proteção do trabalhador e empreendedorismo. | – Fortalecer parcerias com a Federação de Indústrias, do Comércio e de Agências do Trabalhado e Emprego. | Local |
– Fazer ações de esclarecimento junto aos migrantes e aos empregadores sobre as características da documentação de trabalho desta população, incluindo direitos e deveres. | Local | |||
– Avaliar as especificidades de estudantes estrangeiros que não têm direito a carteira de trabalho para ajudá-los a conseguir alguma fonte de renda legal (estágio remunerado, bolsas de pesquisas, outras formas de auxílios). | Local | |||
4 | Promoção da Causa das Migrações |
Informar a sociedade brasileira sobre a temática da migração e do refúgio, promovendo valores de solidariedade, respeito e tolerância, reconhecendo direitos e obrigações. |
– Provocar a mídia local para a produção de notícias que reflitam valores de respeito à população migrante. | Local e |
– Estimular a criação de campanhas nas escolhas para informar sobre e promover respeito à população migrante. |
Local e Nacional |
|||
– Tentar participar de comitês e conselhos (municipais e estaduais) que debatem temas sociais, levando a preocupação com a população migrante. |
Local e Nacional |
Grupo de Trabalho da REGIÃO NORTE
Ordem | Área Temática | Propostas sintetizadas |
Ações de Incidência da Sociedade Civil |
Âmbito de Atuação |
1 |
Abrigo Temporário, Locais de acolhida |
Abertura de novas unidades de acolhida temporária para receber migrantes e refugiados chegados ao país, atenção especial a grupos familiares. |
– Advogar com o governo municipal e Estado, Secretaria de Assistência Social para abertura de espaços de acolhida para os migrantes. | Local |
– Informar-se sobre as politicas sociais e ocupar lugar nos conselhos – SEAS, CRAS, CREAS, CMAS. | Local | |||
– Pressionar o governo do estado sobre o desvio de função dos abrigos e casas de passagens que estão sendo usadas p/ outras finalidades. | Local | |||
– Fiscalizar corretamente os abrigos para que os mesmos possam atender aos migrantes e refugiados. | Local | |||
– Propor a criação de parcerias para abertura de novos abrigos (quando inexistentes) e projetos encaminhar projetos por meio das instituições da Redemir. | Local | |||
– Se informar sobre boas práticas existentes nas faixas de fronteira para colaborar com o governo. | Local | |||
2 | Saúde | Garantir o acesso à saúde básica, preventiva e atendimento específico à população de interesse na chegada ao país (vacinas, exames laboratoriais e tratamento emergencial, entre outros). | – Promover ações de sensibilização junto aos cidadãos e às equipes dos centros de saúde e dos hospitais sobre os direitos e deveres dos migrantes e refugiados. | ? |
– Exigir o cumprimento da Lei 6259/75 (Art.10) que estabelece que a notificação compulsória de casos de doenças possui caráter sigiloso (utilizar exemplo dos casos de haitianos). | ? | |||
– Advogar junto ao governo para capacitar funcionários da região de chegada do migrante do refugiado atender esta população considerando suas especificidades. | ? | |||
– Advogar junto ao Conselho Municipal de Saúde a presença de médicos que falem o(s) idioma(s) dos migrantes e refugiados em regiões onde haja uma grande concentração desta população. | ||||
– Inquietação do Grupo: necessidade, e consequente falta de serviços disponíveis, no campo da saúde mental à população migrante e refugiada. | ? | |||
3 | Trabalho, Inserção Laboral e Empreendedorismo | Criar mecanismos para prevenir a exploração no trabalhador migrante e refugiado e para facilitar o acesso de dos mesmos ao mercado de trabalho formal: documentação, intermediação de mão de obra, qualificação profissional, proteção do trabalhador e empreendedorismo. | – Estabelecer parcerias com o Ministério Público do Trabalho, SENAIS, CETAM etc, sensibilizando tais instituições sobre o tema das migrações, direitos e deveres dos migrantes e dos refugiados. | ? |
– Solicitar a inserção dos migrantes e refugiados nos cursos do PRONATEC. Há um impedimento para o cadastro desta população no site do programa, pois é pedido o “RG” como documento de identificação do candidato, o que não contempla os estrangeiros que possuem o “RNE”. | ? | |||
– Promover ações de sensibilização com empregadores sobre os direitos e deveres laborais dos migrantes e refugiados. | ? | |||
4 | Legislação | Adotar uma nova Lei de Migrações, ratificação da Convenção dos Trabalhadores Migrantes e aprovação da PEC que permita o voto aos estrangeiros residentes no Brasil. | – Impulsionar as ações da COMIGRAR para que elas se tornem reais. | ? |
– Advogar junto ao legislativo para a aprovação de uma nova Lei de Imigração. | ? | |||
– Advogar pelo direito ao voto dos migrantes e dos refugiados. | ? | |||
– Advogar pela concessão automática da residência permanente para os refugiados. | ? |
Grupo de Trabalho da Região SUL
Ordem | Área Temática | Propostas sintetizadas |
Ações de Incidência da Sociedade Civil |
Âmbito de Atuação |
1 | Legislação | Adotar uma nova Lei de Migrações, ratificação da Convenção dos Trabalhadores Migrantes e aprovação da PEC que permita o voto aos estrangeiros residentes no Brasil. | – Promover fóruns, audiências públicas, palestras, seminários e etc, envolvendo as universidades nestes espaços, para debate e reflexão da temática. | ? |
– Promover ações de Lobby nas casas federais que a proposta da nova legislação seja votada, envolvendo as representações politicas locais e estaduais nessa articulação. Junto a essa ação, mobilizar uma ação nacional com a presença dos próprios imigrantes nessa ação. | ? | |||
– Implantar e implementar os comitês estaduais descentralizando também para os regionais/municipais. | Local | |||
2 |
Abrigo Temporário, Locais de acolhida |
Abertura de novas unidades de acolhida temporária para receber migrantes e refugiados chegados ao país, atenção especial a grupos familiares. | – Promover debates e reflexões junto aos órgãos públicos municipais e estaduais para viabilizar a efetivação desses espaços. | ? |
– Informar que o MDS abriu edital para os Estados mapear os locais onde a demanda é mais urgente. | ? | |||
3 | Trabalho, Inserção Laboral e Empreendedorismo | Criar mecanismos para prevenir a exploração no trabalhador migrante e refugiado e para facilitar o acesso de dos mesmos ao mercado de trabalho formal: documentação, intermediação de mão de obra, qualificação profissional, proteção do trabalhador e empreendedorismo. | – Compartilhar de materiais orientativos já existentes de experiência como Porto Alegre, São Paulo e do Ministério da Justiça de cartilhas contendo direitos e deveres trabalhistas para os trabalhadores migrantes e empregadores. | Nacional |
– Incentivar o cadastro único dos trabalhadores migrantes no SINE. | Nacional | |||
4 | Educação | Ampliar e divulgar os cursos de português e cultura brasileira para migrantes e refugiados | – Buscar parcerias com universidades núcleos de educação para descentralizar cursos em espaços mais acessíveis aos imigrantes. | ? |
– Incentivar a implantação nas universidades da Cátedra Sergio Vieira de Melo. | ? | |||
– Mobilizar e motivar voluntários/estagiários para a promoção dos cursos de português nas entidades. | ? | |||
– Promover oficinas sobre o sistema educacional brasileiro para orientação sobre procedimentos para regularização e validação dos certificados dos imigrantes. | ? | |||
– Advogar pela promoção do Ensino Integrado: ensino público + empresas + instituições filantrópicas. | ? | |||
– Buscar a inserção dos imigrantes refugiados no Sistema S. | ? | |||
Inquietação do Grupo: Como fazer a tradução juramentada dos certificados de ensino médio e outros da população? Quem assume esse custo? | ? | |||
5 | Saúde | Garantir o acesso à saúde básica, preventiva e atendimento específico à população de interesse na chegada ao país (vacinas, exames laboratoriais e tratamento emergencial, entre outros). | – Mutirão de atendimento da população migrante em parceria com os postos de saúde (UBS). | ? |
– Motivar o cadastramento no SUS e SUAS. | ? | |||
– Produzir cartilhas com orientação e informações quanto aos direitos na área da saúde e os locais de atendimento. | ? | |||
– Propor uma capacitação aos técnicos da área da saúde e conselhos das respectivas profissões, principalmente no que tange a saúde mental da população migrante. | ? | |||
– Propor um diálogo entre a RedeMiR e o Ministério da Saúde para viabilizar a proposta dentro do Programa mais Médico acordado com os municípios, que tenha como um dos critérios de seleção de um profissional para uma determinada região, a identificação da nacionalidade desse médico com os locais onde há um fluxo migratório mais específico e que tenha essa identificação com o profissional. | ? |
AÇÕES DE INCIDÊNCIA – NÍVEL NACIONAL
Os temas priorizados seguem resumidos por região no quadro abaixo. Considerando apenas os três primeiros temas priorizados e atribuindo um sistema de pontos
Quito abriu sua exposição falando da necessidade de se discutir os aspectos associados ao surto de ebola especialmente na tentativa de sensibilizar a respeito do grau de vulnerabilidade associado a deslocamentos e esclarecer a questão junto a agentes de Estado e demais atores que fazem parte da proteção internacional, a fim de diminuir a ansiedade e de contribuir na acolhida mais eficiente, humana e solidária a migrantes.
Contextualizando, o surto do ebola vem acontecendo desde o final do ano passado na costa ocidental da África; é um vírus com alto poder infectante; foi descoberto às margens do rio Ebola em 1976 por Piot, pesquisador europeu; e o surto atual é considerado o mais impactante para a saúde pública internacional. Primeiro, porque vem se arrastando ao longo do tempo. Esse aspecto, associado ao alto grau de letalidade, agrava a preocupação geral sobre o assunto, mas é necessário desconstruir o pânico – que é um caos para quem lida com a saúde pública e com fluxos migratórios.
A doença é, sim, considerada gravíssima (grau de classificação de agente biológico nível 4). A Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou emergência internacional de saúde pública em 8 de agosto com o intuito de amparar e angariar mais esforços e recursos para os países afetados pelo surto, e não para reforçar os países a erguerem medidas contra o deslocamento de pessoas. A iniciativa, portanto, é fortalecer as medidas humanitárias para resolver o problema do surto na localidade. Assim, trabalha-se com a noção de que não é verdade que o ebola vai colocar em risco todos os países do mundo. A análise de risco que se faz é relacionada aos países acometidos pelo surto, com disseminação estendida da doença, quais sejam: Guiné, Serra Leoa e Libéria.
Nesse momento, o surto nesses 3 países está fora de controle. O vírus tem alto poder de infectante, mas só ocorre pelo contato próximo. O contágio se dá por contato com secreção, sangue ou excrementos – diferente, por exemplo, do sarampo, que se transmite pelo ar. A transmissão só é percebida se a pessoa estiver manifestando os sintomas. Os profissionais de saúde são, assim, considerados o grupo de maior risco de infecção. Mas, novamente, na análise, o risco está associado aos países onde está ocorrendo o surto; em função disso, a orientação e estratégias internacionais para a contenção do surto internacional são direcionadas para conter a transmissão de ebola nesses 3 países (foram pontuais a existência de casos em outros países da África, como Nigéria e Senegal, de pessoas que adquiriram a doença nos países onde ocorre o surto, e, uma vez que não houve mais casos, esses países estão sendo considerados livres do ebola).
Um importante aspecto de disseminação maciça nos 3 países tem a ver com a forma como as pessoas tratam os corpos dos familiares mortos, de contato muito próximo. Esse caráter cultural contribui na infecção, pois o cadáver continua transmitindo o vírus. Trabalha-se com um cenário de alta gravidade para esses países, com medidas sanitárias de restrição de saída. A orientação da ONU é restringir a saída das pessoas que têm sentido manifestação de sintomas ou tenham tido contato com pessoas doentes. Essa é a única orientação restritiva que tem acontecido no mundo.
Saindo do cenário da África ocidental, a análise de risco feita se dá a partir da perspectiva de ingresso da doença nos países. No caso do Brasil, trabalha-se com duas linhas de hipótese. A primeira é quando uma pessoa chega ao Brasil e, com alguns sintomas, apresenta-se ao serviço de saúde relatando ter tido contato com uma pessoa doente na região do surto. Há um protocolo de ativação nesses casos: o serviço de saúde é responsável por acolher e será responsável por executar medidas já previstas. A segunda hipótese refere-se a um cidadão que está em deslocamento por avião ou navio e é caracterizado como caso suspeito, após ter estado na região de surto e manifestado sintomas. Nesse caso, há protocolos para os aeroportos e portos. A estrutura de recepção nesses casos está preparada.
Existe ainda uma terceira análise de risco, mas de risco considerado muito superficial, relacionada ao ingresso via fronteira seca. O Ministério da Saúde tem trabalhado bastante para desconstruir alguns mitos, principalmente com a Polícia Federal, sobre a entrada do vírus a partir do deslocamento de estrangeiros vindo desses países via fronteira seca. A avaliação demonstra que essa possibilidade é remota (em estudo da ONU que listou 30 países com risco de entrada de ebola, o Brasil aparece com 5% de probabilidade, associada principalmente ao aeroporto de Guarulhos). De todo modo, as orientações para os profissionais de saúde ou que trabalham com migração nas fronteiras são: havendo caso de estrangeiro que manifeste sintoma, deve-se imediatamente envolver a Anvisa (que tem telefone 24h por dia para contato). Após essa comunicação, automaticamente o protocolo passa a funcionar, envolvendo Ministério, secretarias de saúde e postos locais. O caso suspeito será monitorado, assim como os agentes de fronteira que estiveram em contato direto com ele.
Considerado isso, insiste-se para que não haja diferenciação de tratamento de migrantes e para que não se pense que é necessário estar paramentado para atender um cidadão africano, por exemplo. Sobre os africanos que chegam ao país, a maior preocupação do MS, na verdade, é relativa à malária, doença letal cujo maior desafio de tratamento é o diagnóstico errado, que ocorre em muitos casos e leva o paciente a não ser devidamente medicado. A probabilidade maior de doença é a malária, e ela deve ser descartada quando eventualmente se estiver tratando de casos suspeitos de ebola, que têm sintomas semelhantes em um primeiro momento. Nessa direção, uma coisa que se discute nesse cenário é que provavelmente a letalidade de malária na região extra-amazônica brasileira irá cair, pois serão feitos testes rápidos para descartá-la, ou confirmá-la, quando se tiver à frente de casos suspeitos de ebola. Seguiu-se um debate e esclarecimento de dúvidas com os participantes.
5.9 Avaliação do Encontro – Síntese
Total de fichas de avaliação preenchidas: 50
Marque com um X sua opção | Ótimo | Bom | Regular | Comentários ou mensagens | |
1. Hospedagem |
Hospedaram-se no local 34 pessoas | 27 | 7 | — |
|
Não se hospedaram: 16 | — | — | — | ||
2. Alimentação |
40 | 9 |
|
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3. Material distribuído |
41 | 8 | 1 |
|
|
4. Informações prévias e organização | 40 | 7 |
|
||
5. Confraternização |
38 | 9 |
|
||
6. Conferências e exposições |
37 | 13 |
|
||
7. Trabalhos em grupo | 25 | 18 | 2 |
|
|
8. Interação entre os participantes/entidades | 29 | 17 | 1 |
|
À pergunta “Saio do Encontro…” responderam: Feliz: 26; Amimado/a: 28; Confiante: 11; Preocupado/a: 4; Com ideias novas: 19. Outras expressões referidas espontaneamente: Mais esclarecida, Desafiada, Confirmação.
Indique um ponto forte deste Encontro:
ü Seriedade e compromisso da Rede em cumprir seus planos para proteção aos refugiados e imigrantes;
ü A escolha dos temas;
ü As experiências dos representantes das instituições que formam a Rede
ü A troca de experiências entre os participantes, e a oportunidade de conhecer mais membros da Rede;
ü Ouvir experiências;
ü Integração das entidades, assuntos atuais;
ü Participação e maturidade
ü Participação de refugiados e imigrantes;
ü A organização do Encontro e atenção do IMDH;
ü Integração;
ü Troca de experiências;
ü Troca de experiências, desafios e conquistas entre as diferentes entidades;
ü O ambiente, os temas, a confraternização;
ü Os palestrantes convidados foram bem selecionados e contemplaram os anseios da Rede
ü Panorama sobre legislação, questões de saúde e trabalho; as proposições dos grupos;
ü As exposições dos convidados, a participação de muita gente pela primeira vez;
ü Participação dos imigrantes e fortalecimento das redes e parcerias, ajuda na troca de experiências e o enriquecimento mútuo;
ü Iniciativas e processos legislativos em trâmite (apresentação de Marcia)
ü Integração, muita informação;
ü Confraternização
ü Os 10 anos da Rede, a integração com migrantes e refugiados, o tema da migração em trâmite no Congresso;
ü Troca de experiências com formação
ü O nível das apresentações dos relatores;
ü A liderança discreta da Ir. Rosita Milesi
ü Oportunidade de partilha
ü O tema do Encontro, as exposições;
ü Lutas pelos direitos dos Refugiados e dos migrantes;
ü A conferência de Márcia Sprandel (2)
ü A integração no debate
ü A caminhada da rede e participação de pessoas novas: migrantes e refugiados
ü As exposições possibilitaram um conhecimento grande (2)
ü A recepção na chegada;
ü A integração e interação entre os participantes (2)
ü As palestras e os conteúdos precisos;
ü A dinâmica do Encontro
ü A troca de experiências e saberes no movimento de articulação e fortalecimento da Rede;
ü Processos Legislativos
ü Os temas discutidos e debatidos e a convivência (3)
ü As mesas muito boas, com temas bem esclarecedores;
ü Informações prévias e organização;
ü Interação entre a sociedade civil e o Estado;
ü Encontro de pessoas, sensíveis à causa do migrante e refugiado;
ü Os trabalhos em grupo;
Indique um ponto fraco do Encontro:
ü No momento, não tenho nenhum;
ü Problemas de internet que não funcionou (2)
ü O tempo curto para temas tão abrangentes;
ü Não houve pontos fracos;
ü Pouco tempo de debate (4)
ü Não houve tempo para passear;
ü A pedagogia fraca;
ü Faltou alguma dinâmica durante a tarde;
ü Faltou haver diariamente uma parte celebrativa da vida – mística em cada dia, como no início.
ü Muito conteúdo para ser absorvido;
ü Só um participante por entidade; seria bom que mais pessoas pudessem participar;
ü Pouco tempo para partilhas locais;
ü Pouca interação com a assembleia (diálogo);
ü Faltou a presença e fala “oficial” da Igreja (CNBB);
Em novo Encontro eu gostaria de:
- Ser convidado (4)
- Aprofundamento de métodos de ação junto aos migrantes;
- Que continuassem as boas palestras!!
- Direito de voto para os migrantes e refugiados;
- Políticas Públicas de proteção ao Migrante e ao Refugiado;
- Um diálogo com o Governo sobre a nova lei de migrações;
- Discutir migração inserida nas políticas públicas;
- Participar do encontro (2)
- Mais atividades lúdicas, cine-forum
- Continuar aprofundando as propostas até que sejam efetivadas;
- Reduzir o número de exposições e expositores. É melhor 2 do que 3 expositores;
- Um debate sobre os egressos estrangeiros;
- Ter Mística no começo de cada dia;
- Ter capacitações com diploma;
- Pontuar os grandes desafios da migração;
- A possibilidade de ampliar a participação por entidade;
- Incluir falas/experiências de imigrantes e refugiados;
- Compor uma mesa com os próprios migrantes;
- Mais espaço para partilha da Assembleia (3)
- Considerar a organização como ponto importante, assim como foi realizado este Encontro;
- Ter mais oportunidade de conhecer o trabalho das organizações presentes;
- Ter um resumo dos avanços do Encontro;
- Que Estados e Organismos internacionais sejam mais práticos e úteis em seus planos e que façam menos discurso e mais ação, a exemplo da sociedade civil;
- Apresentações culturais brasileiras e de imigrantes;
- Ter um espaço nas mesas de trabalho para dar visibilidade a alguns projetos “bem sucedidos” de membros da rede (não só no Grupo de Trabalho, mas também nas mesas);
- Que o Encontro fosse mais longo (2)
- Palestra sobre “mercado de trabalho” e sobre “Análise de Conjuntura Social”. Precisamos conhecer a “proposta” do sistema capitalista para repensar a nossa ação. Estamos desperdiçando nossa força (preciosa) e por vezes tem sido em vão, frente ao sistema vigente; faz-se necessário repensar a rever nossos planejamentos, uma vez que o número de excluídos tem aumentado e vai aumentar. Temos muita força, mas ainda não sabemos articulá-la o suficiente para enfrentarmos o sistema capitalista; é claro que não vamos combatê-lo (o nível é mundial e não local), mas temos que entender o que está por trás ou nas entranhas do sistema.
- Discussões que tivessem um enfoque de gênero, diversidade, idade e raça;
- Palestras e debate sobre especificidades da questão do refúgio/migração em relação a gênero;
- Mais tempo para apresentação das entidades da Rede, relatos dos temas que mais tratam em seu cotidiano institucional. Além disso, seria bom incorporar proposições surgidas nos trabalhos em grupo, como, por ex., saúde mental;
- Um balanço de avanços e conquistas dos encontros anteriores;
Observações:
- Gostaria de sugerir a realização de oficinas para orientação e capacitação dos agentes, para melhor atuar no local onde trabalha;
- Parabéns pela caminhada da Rede! Parabéns Ir. Rosita!
- Dar uma visão geral das migrações em todas as cidades; não falar somente em umas e deixar outras que tem um fluxo forte de migrações;
Anexo 1 – PROGRAMAÇÃO
Dia 07/10/2014 (terça-feira)
Chegada e confirmação de inscrições
19:30 (auditório do CCB): Cine Fórum, com exibição do filme Monsieur Verdoux (Charles Chaplin, 1947, 124 min). Acesso franqueado a todos e todas.
Dia 08/10/2014 (quarta-feira)
Hora | Tema | Expositores/Responsáveis |
07:30 | Café da manhã | |
08:30 | Mística e apresentação dos participantes | Organizadores do evento |
10:00 | Intervalo | |
10:30 |
Breve saudação das entidades promotoras Conferência: “Cartagena +30” |
Representantes das Entidades João Guilherme Granja (Conare) Andrés Ramirez (ACNUR) Fabrício Toledo de Souza (CARJ) |
12:30 | Almoço | |
14:00 |
“Novos fluxos migratórios” – Exposição “Ações do CNIg/MTE na área do trabalho, face aos novos fluxos migratórios para o Brasil” – Exposição (Debate) |
Jorge Peraza (OIM) Paulo Sérgio de Almeida (CNIg/MTE) |
16:30 | Intervalo | |
17:00 |
“Iniciativas e processos legislativos em trâmite atualmente na área de Migrações” – Exposição | Marcia Sprandel (Assessora do Senado) |
18:30 | Jantar | |
20:00 | Confraternização |
Dia 09/10/2014 (quinta-feira)
Hora | Tema | Expositores/Responsáveis |
07:30 | Café da manhã | |
08:00 09:00 09:30 |
“Participação social: Nova legislação” – Exposição “Vamos encontrar nossas crianças (prevenção ao tráfico)” – Exposição Orientações sobre Saúde para os Agentes Sociais que atuam com Migrações |
Ricardo Paiva (Conselho Federal de Medicina) Marcus Quito – M. Saúde |
10:30 | Intervalo | |
11:00 | Trabalho em grupos: “Acolhida, integração de imigrantes e incidência em políticas públicas: priorização de propostas” | Ir. Rosita Milesi, Cyntia Sampaio, Izabela Mazão, Pablo de Mattos, outros (coordenadores) |
12:30 | Almoço | |
14:00 | Plenária e apresentação das propostas de ação | |
15:30 |
– Comunicações dos participantes – Avaliação |
|
16:30 | Encerramento | |
Feliz viagem de retorno e boa missão! J |
[1] Onde, 1ª. Prioridade = 3 pontos / 2ª. Prioridade = 2 pontos / 3ª. Prioridade 1 ponto.